Antebellum (2020)

Antebellum prometia muito, mas desiludiu ainda mais

Começo com uma confissão: Antebellum era o filme que eu mais ansiava em 2020. Tudo parecia preparar-se para mais uma grande adição ao cinema de terror, que tão pujante tem estado nos anos mais recentes. O argumento prometia muito e o trailer – embora parecesse entregar o plot twist do filme – deixava no ar um clima de terror e suspense, aliado a temáticas como a escravatura e o racismo. No papel principal, tinhamos Janelle Monáe, que, basicamente, brilha em tudo o que faz, seja como cantora, atriz ou até como anfitriã do número de abertura dos Óscares. E ainda nos acenavam com a frase “dos produtores de Get Out e Us”.

Sou contra spoilers fazerem parte de críticas, mas aqui vou fazer um desconto. Afinal, o próprio estúdio vendeu o filme com o seu maior spoiler, o estúdio descreve o argumento como “a história segue uma bem sucedida escritora afro-americana que, de súbito, se vê prisioneira numa plantação de escravos, lutando pela sua fuga”. Ok, não existiria aqui nenhum problema, caso o filme seguisse uma edição cronológica linear. Mas Antebellum não é assim. O primeiro acto de Antebellum começa na plantação de escravos – começa muito bem, aliás, com fantásticos planos e um excelente uso das cores -, mostra-nos as primeiras tentativas de fuga de Eden, sem haver referências ao ano dos acontecimentos. Depois, o filme passa para o segundo acto, que, subitamente, nos mostra como chegamos até aí, apenas na perspetiva da protagonista principal, não se percebendo bem a dimensão e escala envolvida para tal vir a acontecer. No terceito acto, o filme volta à fazenda.

Há aqui algo de errado narrativamente? Nem por isso. As histórias não têm que ser contadas de modo linear e há inúmeros exemplos de filmes que resultam ao utilizar essa técnica. O que, quanto a mim, não resulta é que todo o impacto da estrutura ser como é, é perdido no trailer e no argumento disponibilizado, não parecendo, assim, existir qualquer razão para esta ser a estrutura escolhida. No entanto, esta não é a única falha do filme. Há filmes que se sustentam bem, mesmo sabendo-se, antecipadamente, de plot twists.

O problema maior é que o enredo do filme parece muito pouco trabalhado. A ideia é excelente, promissora, mas parece que depois tudo foi feito à pressa, que o guião tem pouco a dizer, a não ser que “este grupo é racista e criaram este mundo paralelo porque sim” e “os escravos tentam fugir da fazenda”, sem oferecer qualquer reflexão ou sequer puxar pela nossa capacidade intelectual.

A mensagem que o filme pretende passar – dos perigos do fundamentalismo, dos perigos das redes sociais e discursos incendiários – é correcta, mas não havia necessidade da mesma ser atirada na nossa cara, como se fosse um camião TIR, deixando a subtileza (que fazem das obras de Peele, por exemplo, as referências que são) de lado. Outro factor negativo foi o filme ter sido vendido como terror puro. Há alguns elementos que podem entrar no campo de terror, mas há muito pouco – além da escravatura ser, realmente, um tema mais arrepiante do que o que muitos filmes de terror retratam – para que se possa enquadrar o filme exclusivamente no género de terror, sendo muito mais um thriller dramático. 

O que resulta afinal? Além do excelente trabalho de fotografia e guarda-roupa, a interpretação de Monáe está à altura dos acontecimentos, seja na fazenda ou no mundo exterior. Fica a sensação que também ela estava à espera de um guião que lhe desse algo mais para trabalhar, onde se pudesse fazer uma maior reflexação sobre o mundo atual e os paralelismos para com os tempos da escravatura. Em certos momentos, o filme resulta pela sua tensão e deixa-nos realmente interessados no que pode vir a acontecer a seguir. No entanto, na sua generalidade, Antebellum não convence e é uma das maiores desilusões de 2020.


Antebellum
A Escolhida

ANO: 2020

PAÍS: EUA

DURAÇÃO: 105 minutos

REALIZAÇÃO: Gerard Bush, Christopher Renz

ELENCO: Janelle Monáe, Eric Lange, Jena Malone, Gabourey Sidibe

+INFO: IMDb

Antebellum

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