Bailey encanta em A Pequena Sereia

Há pouco tempo – aquando do remake de Peter Pan – falei da obsessão da Disney com os live-action dos seus filmes animados. Há várias razões para estes existirem e os resultados finais são distintos, sendo que alguns parecem pouco mais do que querer o nosso dinheiro sem nos darem absolutamente nada em troca, a não ser nostalgia. Vamos tirar as dúvidas da frente: A Pequena Sereia surpreendeu-me.

Nesta versão live-action, a Disney decidiu incorporar várias cenas ao seu fime original. Mantém praticamente tudo do filme original – e palmas para isso, porque se está bom, não se mexe – e acrescenta novas cenas, o que aumenta a duração do filme em mais 52 minutos (após créditos).

Inicialmente pensei que isto seria um grande erro, mas fui surpreendido por tudo isto ter feito sentido. As novas cenas resultam bastante bem. São em terra, um mundo pouco explorado no filme original e com isso é-nos permitido explorar e desenvolver mais o romance, bem como saber mais acerca do príncipe Eric (Jonah Hauer-King) e ver mais da adaptação de Ariel (Halle Bailey) a este novo mundo, já sem a sua voz. Algumas das melhores – e mais divertidas – cenas desta versão – seja a viagem ao mercado ou quando Ariel explora a biblioteca – acontecem durante essa fase e são especialmente importantes porque nos demonstram que Ariel tem muito para dar e ensinar aquele príncipe, não só pela forma enérgica e jovial com que encara a vida, mas também ao nível de conhecimento, o que acaba por contribuir para o crescimento de ambas as personagens. 

Tudo isto iria sair ao lado se não gostássemos de explorar este novo mundo através dessas mesmas personagens. Mas é impossível não gostar! A química entre Ariel e Eric – ou Bailey e Hauer-King – é grande, vai crescendo ao longo do filme e é contagiante. Este é um romance que nós queremos que dê certo, que nos faz recordar os nossos romances adolescentes e que nunca chega a enjoar pela lamechice, muito por culpa das divertidas personagens secundárias, principalmente o caranguejo Sebastian (Daveed Diggs), que sempre lá estão para um divertido momento.

Óbvio é, ainda assim, que a pedra fulcral para que isto dê certo é Ariel. Halle Bailey tem uma perfeita interpretação neste papel provando ser a escolha certa, provavelmente a escolha mais acertada da Disney em muito tempo. Sempre que há um número musical, Bailey demonstra todas as suas enormes capacidades musicais, sendo capaz de todos levantar das suas cadeiras. É, no entanto, como atriz que Bailey mais surpreende. A vivacidade dada à personagem encanta qualquer pessoa e é sempre capaz de nos transmitir um misto de inocência e rebeldia que é exatamente o que deve caracterizar Ariel. Ainda mais surpreendente é que mesmo no período em que a mesma não pode utilizar a sua voz, Bailey enche o ecrã através da sua expressividade, quer pela forma como se mexe, pela forma como gesticula ou apenas e só pela forma como nos demonstra todas as suas emoções com um simples olhar.

Jonah Hauer-King como Príncipe Eric é também um boa surpresa, embora seja difícil perceber até que ponto a sua atuação não foi elevada pelo excelente trabalho de Bailey. Quanto aos mais experientes, Javier Bardem tem uma decepcionante interpretação como o Rei Tritão – sempre muito forçado e pouco credível na sua atuação – enquanto Melissa McCarthy justifica a escolha como Úrsula, dando um bom uso ao tempo de ecrã a que tem direito. 

A Pequena Sereia não é um filme perfeito. Os efeitos debaixo do mar ficam a desejar. Falta muita vida àquele mundo, falta cor e é impossível não comparar com outros mais belos mundos aquáticos depois de Avatar: The Way of Water. Também por decorrer muito nesse mundo, a parte inicial não é especialmente bem conseguida, perdendo em comparação com a animação. A batalha final é também ela decepcionante, parecendo passar demasiado depressa – problema similar ao filme original – e com uma edição longe de perfeita. De qualquer forma, os momentos altos acabam por compensar as falhas e há alguns momentos de verdadeira magia nos mais extensos números musicais (Rob Marshall é experiente no que a musicais diz respeito e isso é notório), seja em favoritos dos fãs, como Part of Your World, Kiss the Girl – brilhante! – ou Under the Sea ou até na inspirada nova adição, For the First Time, onde vemos Ariel a descobrir um mundo diferente de forma original e bem conseguida. O comentário sócial desta versão é mais forte do que o do filme original – referências a “mundos diferentes” estão muito presentes e são bem trabalhadas – mas nunca chega a parecer doutrinário, constando na medida e peso certos, estando muito subentendido e deixado à imaginação dos espectadores.

Ainda que o mundo aquático seja desapontante, a Disney pode respirar de alívio porque este é um live-action que realmente resulta, justificando a sua existência com a adição de relevantes cenas que destacam a mensagem e elevam o produto final. Halle Bailey é a Ariel perfeita, encantando como o canto de uma sereia com uma interpretação absolutamente irrepreensível cheia de expressividade e emoção. Uma das melhores escolhas de elenco da história da Disney.


The Little Mermaid
A Pequena Sereia

ANO: 2023

PAÍS: EUA

DURAÇÃO: 135 minutos

REALIZAÇÃO: Rob Marshall

ELENCO: Halle Bailey; Jonah Hauer-King; Daveed Diggs; Awkwafina; Jacob Tremblay; Noma Dumezweni; Art Malik; Javier Bardem; Melissa McCarthy

+INFO: IMDb

The Little Mermaid

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