É indesmentível que Wes Anderson tem traços muito próprios e distintos. Tudo o que alguém venha a fazer com similar simetria, cores vivas, cenários tão interativos, com aquele muito seu movimento de câmara e com tamanha inexpressividade dos atores em cena…será sempre visto como uma cópia de Wes Anderson e todo o mérito deve ser dado ao cineasta norte-americano por isso. No entanto, ter identidade própria não é, por si só, garantia de que todas as suas obras mereçam um selo de aprovação.
Esta crítica destina-se, principalmente, a quem anda usualmente na fronteira entre gostar ou não gostar de um filme de Wes Anderson. Falar para os fãs mais ortodoxos de Anderson é quase o mesmo que falar para os fãs mais ortodoxos da MCU ou de Star Wars, com a diferença de que os fãs de Anderson são, usualmente, mais altivos do alto da sua apreciação da arte que eles consideram divina. Quem ama o estilo do realizador e considera que isso é o suficiente para si, sairá maravilhado deste filme. Não tenho dúvidas. Mas quanto aos outros?
Neste Asteroid City, Anderson toca numa temática surpreendente para ele – aliens – e fá-lo de forma inteligente, através das gravações de uma peça dentro da peça. Parece interessante, mas a verdade é que esse interesse dissipa-se terminado o primeiro ato. Ao contrário de obras anteriores, como The Grand Budapest Hotel, onde se percebia onde se queria chegar, em Asteroid City, estamos apenas ali, ocasionalmente, com aquelas personagens. É interessante estar com elas naquele local, mas não há muito que justifica passarmos lá tanto tempo. O tema do luto é colocado em cima da mesa desde muito cedo – afinal, uma das personagens principais conta aos seus filhos, passado três semanas, que a mãe morreu – mas não é feita qualquer análise ao mesmo ao longo de toda a obra, variando as reações a isso entre a profunda indiferença até momentos cómicos sem qualquer profundidade. Outros temas levemente abordados, como o encontro com o desconhecido ou a vida de artista, não vão também muito longe e chegamos ao final sem entender muito bem qual era o propósito daquilo que vimos. Acreditemos que seja o luto, pois foi aquilo mais abordado, embora de forma totalmente superficial. Ai de mim, ainda assim, condenar como cada um vive o seu luto. Talvez tudo seja para demonstrar a apatia dos que ficam sem uma peça importante de si…
Tudo bem, não se entende muito bem o que é dito, mas é divertido, ao menos? Não. Há partes engraçadas – como a máquina eletrónica que vende terrenos ou o jovem que quer ser desafiado para fazer sempre o pior possível – mas são momentos encaixados num vazio total narrativo, que quando chegam quase que nem um sorriso da cara nos retiram. Talvez o que Anderson quisesse era que nós, como espetadores, reagissemos com a mesma expressividade que ele pede aos seus atores.
Falando em atores, tenho dificuldade em identificar quem se destaca num filme e guião que pede praticamente o mesmo de todos eles. Digamos que achei a personagem de Jeffrey Wright a mais consistentemente engraçada e a de Scarlett Johansson a mais enigmática e por isso levam os louvores. Falei-vos também de aliens, certo? Bem, é o que podem esperar de um filme do género. A primeira cena com o mesmo até tem o seu charme, mas também logo aí fica a sensação de que mais poderia ter sido extraído, mesmo na simplicidade e comicidade pretendida. Ainda não entendi bem o seu propósito…
Quando chegámos ao terceiro ato, eu já só desejava o final do filme. Este chegou com uma mensagem atirada na minha cara com a quebra da quarta parede de forma abruta e muito simplista, quase como se Anderson se tivesse lembrado do que queria dizer com tudo isto e tivesse que o gritar nos nossos ouvidos. É pena. Não acredito que o norte-americano algum dia mude o seu estilo. Gostava de ver, mas já não fará muito sentido. Tenho, no entanto, receio que o que vejamos daqui para a frente não passe de uma cópia barata de tudo o que já fez, quase que uma paródia de si próprio. Os elementos identificativos estão cá todos, mas elevados ao extremo, com muito pouca finalidade e ainda menos substância. Estilo acima de substância poderá agradar a muito boa gente que dê primazia à estética, mas narrativamente é necessário mais do que o absoluto vazio.
Embora com menos humor e ainda menos para dizer, Wes Anderson faz, do ponto de vista técnico, o mesmo filme que sempre tem feito. Todas as principais marcas identitárias estão aqui: os visuais coloridos, um incrível design de produção, mise-en-scène fascinante e o repetido movimento de câmara lateral. Isso também inclui a quase total ausência de substância, a falta de rumo, o aborrecimento, a monotonia e a inexpressividade de quem está em cena. O que para muitos é quirky e refrescante, deixa de ser original quando se repete filme após filme. Mas, como qualquer outro filme de Anderson, terá os seus fãs acérrimos.