2022 ficará marcado como um dos melhores anos da história do cinema de terror e ainda havia, pelo menos, mais um trunfo guardado. E o melhor? Muitos dos filmes que marcaram o ano vieram de onde menos se esperava, com ideias originais e pelas mãos de realizadores estreantes no género. É o caso de Barbarian que teve quase-quase a ser lançado diretamente nos serviços de streaming nos EUA – acabou por ter em Portugal – acabando depois por ser um enorme êxito de bilheteira.
A história do filme agarra-nos logo nos seus minutos iniciais. Uma jovem – Tess – em busca do seu emprego de sonho aluga uma casa através do Airbnb e descobre que…já está lá alguém – Keith – que também alugou a casa numa diferente plataforma. O ambiente de suspeição e de clima pesado está sempre presente, principalmente por sabermos que isto é um filme de terror e que, certamente, algo estará por acontecer. Mas talvez o que esteja para acontecer seja bem diferente daquilo que inicialmente pensámos, nunca sabendo o que esperar da cena seguinte.
Embora o argumento e a estrutura sejam, provavelmente, os pontos mais fortes de Barbarian, seria dificil que o filme fosse tão bem sucedido caso não tivesse sido tão bem interpretado pela dupla de atores principais que acompanhamos no primeiro ato. O homem que lá se encontra em casa, Keith, é interpretado pelo nosso bem-conhecido Bill Skarsgård (sim, o Pennywise de IT!) que vive uma personagem diferente daquilo que nos habituamos a ver dele, mas é Georgina Campbell como Tess que é, não só a maior surpresa, como também é a estrela principal do filme. Durante o primeiro ato fica bastante fácil empatizarmos com a mesma, sentindo a desconfiança que esta sente, sentindo o medo, sentindo pânico em determinadas situações, medo, mas mais impressionante é quando ela nos consegue transmitir a mesma credibilidade quando o seu “coração começa a derreter” e a ceder aos encantos de Keith ou quando precisa de ser uma autêntica badass! Outra cara conhecida, Justin Long (Jeepers Creepers já foi há taaaanto tempo!) entra em cena exatamente no início do 2º ato tendo também um enorme destaque e convencendo como o artista que passa dos límites e que tem comportamentos altamente reprováveis, embora tente sempre passar uma imagem de inocência, procurando passar entre os intervalos da chuva e até se convencendo dos seus bons valores morais.
É muito difícil falar deste filme sem estragar nenhuma surpresa, mas sem dúvida que a estrutura clara de três atos e o facto de nos surpreender em cada um desses atos é uma enorme mais-valia. Misturando alguns momentos cómicos com outros de elevado suspense, o terror também aparece em grande força em cenas verdadeiramente inesperadas e aterradoras. Há também muito interessantes opções de edição – seja com ângulos inesperados ou originais transições – e uma banda-sonora que surpreende, parecendo mesclar na perfeição os diferentes estilos e diferentes momentos da obra, ajudando a enfatizar momentos de suspense ou momentos de maior descontração. Todo o controlo deste elementos é ainda mais impressionante se pensarmos que Zach Cregger nunca realizou um filme de terror na sua curta carreira!
Ainda que este seja um filme que se percebe que quer, acima de tudo, entreter e dar-nos um terror original, isso não faz com que a componente de comentário social não esteja também presente. Isso é notório quando nos expõe, de forma convincente, que mulheres e homens ainda têm que ter cuidados diferentes de forma a se auto-protegerem da sociedade. A mulher que tem que suspeitar de tudo. O homem que deve saber como se comportar – exposto através de pólos totalmente opostos entre os dois homens que Tess conhece. Além desse tema, é impossível fugir também do comentário que faz ao despovoamento e abandono de certas regiões (aliás, isso é a matriz que explica muito do terror que se esconde na casa), tendo o seu apogeu em algumas cenas onde vemos a forma como as pessoas que ali se encontram são por todos ignoradas, todas colocadas na mesma caixinha, nunca ouvidas e sempre deixadas ao abandono de uma sociedade que prefere fingir que elas não existem.
Um sucesso a todos os níveis. Barbarian é um filme que surpreende a cada esquina, muito bem conduzido na realização, suportado num inteligente argumento e boas interpretações. Mistura vários géneros e tem três atos bastante distintos que funcionam bastante bem. Uma estreia incrível de Zach Cregger no género!