Idris Elba é puro carisma e talento, mas, por mais que se esforce muito para trazer emoção para a tela, Beast (A Besta) não consegue acompanhar o protagonista, que parece estar sempre um passo à frente do próprio filme. Com uma proposta de enredo já comprovada como muito eficaz por filmes como Cujo e Jurassic Park, Beast promete deixar-nos à flor da pele com muita tensão, mas nunca entrega uma experiência compensadora.
Nate (Idris Elba) viaja para a África do Sul com suas filhas, Norah (Leah Jeffries) e Mare (Iyana Halley), no intuito de melhorar sua conexão com as duas. Em um passeio pela savana, a família se vê encurralada por um enorme leão, tomado por uma ferocidade implacável, e sedento por sangue!
A ideia de ter um pai preso com duas filhas em um carro com uma fera violenta do lado de fora remete diretamente ao clássico da literatura e do cinema, Cujo. Porém, a escolha de levar a ação para fora do veículo e pôr as personagens em situações totalmente desfavoráveis em relação ao seu predador, no estilo gato e rato, nos traz diretamente para Jurassic Park. O primeiro ataque do leão lembra a cena de apresentação do T-Rex no clássico de Spielberg e, mais tarde, há uma clara homenagem à incrível cena da cozinha com os raptores. Mas a principal referência de Beast não fica clara apenas para os cinéfilos mais atentos, pois o filme faz questão de anunciar para o público a origem de sua inspiração. No momento em que conhecemos a família de protagonistas, Mare, a filha mais velha de Nate, utiliza uma camiseta com o logo de Jurassic Park em sua estampa. Beast se orgulha de fazer referência ao renomado filme de dinossauros e quer que todos fiquem cientes de sua inspiração. O problema é que isso mais atrapalha do que auxilia o filme.
Beast externaliza tanto seu carinho pela obra de Spielberg, que faz impossível a missão de não comparar ambos os filmes a cada segundo. Jurassic Park é marcante não só pelo nível de qualidade da computação gráfica que apresenta (que, por incrível que pareça, se sustenta muito bem até hoje!), mas também pela criatividade na realização. Spielberg mescla efeitos visuais e práticos com maestria, conduzindo tudo com tanta elegância, que pouco percebemos as transições de uma técnica para outra. Já Beast, por outro lado, gera constantes desconforto e estranheza. O CGI do filme é decente, e funciona na grande maioria das cenas. O leão que ameaça a família de protagonistas, por exemplo, tem peso e aparenta ser ameaçador. Entretanto, Baltasar Kormákur, realizador do longa, entrega falsos planos sequência remendados por transições digitais tão artificiais, que nos afastam do filme, tornando impossível a total imersão com a obra e dificultando a manutenção do suspense e tensão em cena.
Mas, para não dizer que a realização não tem acertos, devo enaltecer a cena em que transitamos por diferentes sonhos de Nate, entrelaçados entre si, confusos, como se fosse apenas um grande devaneio. Aqui, Kormákur é inventivo e dinâmico. Uma pena não demonstrar a mesma inspiração durante o restante do filme.
Beast tenta ser sufocante, mas é sabotado a todo momento por sua superficialidade técnica. É superficial, também, a tentativa de engajamento dramático criada a partir de um conflito no relacionamento das personagens principais, que parece deslocada do restante do filme e pouco serve para fazer a trama se desenvolver. No fim, Beast desperdiça uma premissa promissora de terror e desespero, com uma injusta comparação autoinfligida, que mantém sua qualidade no inevitável patamar da mediocridade.