Beckett (ou o cliché da vítima do acaso há muito tempo inexplorado)

John David Washington tem, nesta entrega de pouco menos de duas horas, um novo desafio que mais do que nunca visa expor a sua versatilidade, como é apanágio do seu pai Denzel, e ao mesmo tempo demarcar-se de ser conhecido como “apenas o filho do Denzel Washington”.

Beckett não reinventa a roda e por outro lado também não a danifica. A história do tipo a quem acontece algo, dá por si culpado de algo, tenta ilibar-se para se deparar com algo acima de si em que é um mero peão das circunstâncias desse algo, já foi vista e feita com qualidade. Beckett não estragou nada e entretém. Bravo, John David. É mais um passo para te emancipares do apelido, se é que isso é problema para ti.

Adoro este tipo de enredo onde há exemplos de excelência e insucesso com o mesmo. Destaco The Fugitive, protagonizado por Harrison Ford, U.S. Marshals com Wesley Snipes (curiosidade: o personagem Samuel Gerard interpretado por Tommy Lee Jones é o agente que persegue Ford num filme e Snipes no outro. Detalhe delicioso!) e até o mais flagrante desta fórmula e na minha opinião, o mais fraquinho Enemy of the State protagonizado por Will Smith.

Beckett é bem filmado. Tem um grão na filmografia que me remeteu imediatamente a filme europeu com forte cunho italiano. Não me enganei. O elenco técnico é multinacional com destaque evidente para o produtor Luca Guadagnino (realizador de Suspiria) e realizador Ferdinando Cito Filomarino (co-realizador de Call Me By Your Name com Guadagnino).

Grécia como pano-de-fundo para a história é um pouco descaracterizada e só entendemos que é lá que se passa a acção do filme por diálogo expositivo, os locais a falar grego e uns quantos graffitis do AEK pelas ruas de vilas e cidades quando Beckett chega a esses sítios. Até aí podiam ter filmado os dois primeiros actos nas colinas de Hollywood que eu engoliria facilmente que fosse Grécia.

John David Washington tem uma interpretação despretensiosa e a meu ver difícil de acertar, tendo acertado. Aqui interpreta Beckett que é pura e simplesmente um gajo. Nunca houve descura por este aspecto, o que me remeteu nostalgicamente a Frank Kimble que era apenas um doutor em The Fugitive. Faço vénia uma vez mais porque sem ele e sem Beckett ter sido comportamentalmente consistente, o filme poderia ter descarrilado a qualquer momento.

Considero o final abrupto demais sendo que nem sequer permitiu invocar a carga emocional que se esforçou para criar e por vezes se esquece de a trazer consigo, qual Taarabt que esquece a bola na finta de transição. Tal como com Adel, entendo o que a realização pretendia com tamanho travão de acto mas tal como Adel também, fica registada a intenção positiva e execução esquecível, apenas porque gosto dele e sei que não fez por mal.

Beckett é de ver. Está bem estruturado e não faz perder tempo. 3 estrelas seguras e sem grandes alaridos.


Beckett
Beckett

ANO: 2021

PAÍS: Itália, Brasil, Grécia

DURAÇÃO: 108 min.

REALIZAÇÃO: Ferdinando Cito Filomarino

ELENCO: John David Washington, Boyd Holbrook, Vicky Krieps

+INFO: IMDb

Beckett

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