Tento ao máximo evitar criar demasiadas expetativas antes de ver um novo filme. Ainda assim, por vezes isso é missão impossível. É o caso de Belfast que, quando me chegou às mãos, vinha já rotulado de favorito aos Óscares da Academia.
Kennet Branagh conta-nos uma história bastante pessoal sobre uma cidade dividida em duas num dos períodos mais conturbados da história europeia moderna. O cineasta inspirou-se em eventos da sua infância, mostrando-nos o dia a dia de um rapaz que se vai descobrindo, enquanto presencia os acontecimentos conturbados da cidade, vendo também a sua família a passar por dificuldades internas. Este coming of age tem todos os ingredientes para agradar a toda a família: é conduzindo de forma leve – apesar de tudo o que se passa à sua volta -, tem momentos engraçados, tem um excelente elenco e é filmado de um modo muito especial, com cada cena a parecer um retrato a preto e branco. Esta escolha de fotografia é um dos maiores trunfos da obra, uma vez que, com isso, o realizador consegue torná-la pessoal e adaptada ao período de que nos fala, fazendo bom uso de um excelente contraste entre cores mais claras e escuras. Na realização, é também notório todo o amor pela história. Branagh utilizou diferentes ângulos e planos como nunca antes o tinha feito, procurando uma filmagem pouco convencional, com os seus bem-sucedidos close-ups a ficarem na memória de qualquer um que veja o filme – claro, o da sala de cinema já conhecem e o realizador faz questão de o repetir várias vezes!
Sendo a fotografia e a realização tão vistosas, não foi difícil o filme impactar positivamente nos primeiros minutos. A receita para nos prender estava lá. Faltava que tivesse algo a dizer que nos cativasse a permanecer. Desde cedo percebemos, também, que a ação vai ser mais baseada nas personagens do que em algum tipo de acontecimento ou plot em particular e os atores estão, de um modo geral, em bom plano. Embora tenha alguns problemas com o overacting de Jamie Dornan, o pai da criança – como quando o casal explica a mudança ao rapaz – ou com o sotaque de Judi Dench; tanto Ciarán Hinds – no papel de avô – quanto Jude Hill – o rapaz – fazem um bom uso do que o guião lhes permite. A estrela, no entanto, é Caitríona Balfe – a mãe – que é capaz de nos agarrar emocionalmente à sua personagem como não outro é capaz de fazê-lo em Belfast.
A história e o que Belfast tem para dizer sabem, no entanto, a pouco. Acho incrível que uma história passada em tão caótico período consiga ser tão pouco condimentada, com tão pouco sumo para espremer. Os conflitos da cidade são postos em segundo plano e as poucas cenas existentes que deveriam apelar à minha sensibilidade deixaram-me totalmente indiferente. A história da família em si é uma igual a tantas outras, tendo-a já visto mais bem desenvolvida em episódios de telenovelas da Globo. Por isso, por muito que Belfast seja bonito de se observar, por muito que tenha uma excelente banda sonora, tudo o que acontece em cena torna-se previsível e até cansativo, o que não deixa de ser surpreendente para um filme de pouco mais de 90 minutos. A sua abordagem ao conflito – e a posição da família em relação ao mesmo – está presente, mas de um modo tão superficial e contido, que nunca cheira a sinceridade, mas sim, a cobardia de quem quer ser apreciado por todos de forma leve, sem com isso ferir as suas chances de premiação.
Apontado pelos especialistas como o grande favorito aos Óscares, Belfast possui elementos de enorme qualidade técnica e boas atuações. No entanto, os seus elementos narrativos são demasiado básicos e sabem a pouco. Pode mesmo ganhar o principal Óscar – a Academia derrete-se com filmes que mostrem pessoas a sorrir na sala de cinema – mas não posso deixar de olhar para isto como um frango no churrasco com muito pouco sal adicionado.