Biosphere: proposta promissora, execução decepcionante

A proposta é ótima: os dois últimos homens do planeta Terra vivem em um domo projetado para mantê-los vivos após um evento apocalíptico. A dupla enfrenta muitas adversidades para manter sua saúde física e mental, além de dilemas perante sua situação atual e seu incógnito futuro. A trama é intrigante, assim como a escolha de contar a história através da mistura de comédia e ficção científica. Porém, apesar de alguns destaques positivos, Biosphere fica muito aquém do que poderia ser.

Vou focar esta resenha crítica nas duas personagens do filme, pois elas simbolizam perfeitamente tudo o que funciona e o que não funciona em Biosphere. Os dois amigos de infância, Ray e Billy, são extremamente unidos e leais, apesar de todas as suas diferenças. Um é guiado pela razão, o outro pela emoção. Um representa a ciência e o tom de seriedade da trama, enquanto o outro representa a impulsividade e a tonalidade cômica do filme. Um funciona muito bem, o outro não.

Ray é vivido por Sterling K. Brown, e quem conhece o trabalho do ator sabe da qualidade do seu representar. Sterling é ótimo, e sempre vive suas personagens com muita intensidade e veracidade. Em Biosphere não é diferente. Ray é um homem da ciência, centrado e focado, apesar de sempre ceder ao humor de seu amigo. E é quando Ray está em destaque, quando o foco se volta para o que há de mais sério e denso no enredo, que o filme se mantém mais estável. Mas, mesmo quando Ray se encontra com a comicidade de Biosphere, portanto, com o que considero o ponto mais fraco do filme, a personagem tende a funcionar. Sterling K. Brown é tão bom ator, tão natural no que faz, que nem mesmo o fraco humor do argumento faz com que o ator deixe de brilhar. Já aprofundo mais sobre o assunto, antes devemos conhecer seu amigo.

Billy, vivido por Mark Duplass, é imaturo e emotivo. Diferente do seu colega de cena, não conheço o trabalho de Duplass e, sinceramente, o que vi em Biosphere não me anima a ir atrás de outras obras em que o ator esteja envolvido. Billy é uma personagem irritante e forçadamente boba, e a atuação de Duplass não convence nem um pouco. Toda a composição da personagem é mecânica, exagerada, completamente divergente do que vemos acontecer com Ray. Tudo bem que parte da proposta do filme consiste em acompanhar a convivência entre duas personagens muito diferentes entre si, mas a dinâmica entre Ray e Billy não acontece de forma natural, nada encaixa. Ainda se Billy fosse uma personagem carismática, poderia pensar em passar pano para tal incoerência, mas Mark Duplass é insuportável!

Billy e Ray, respectivamente.

E o que também não convence em Biosphere é o argumento, pelo menos não completamente. Digo isso pois no que toca a ficção científica, o filme tem suas boas ideias, mas quando o assunto é o humor, a história é outra. Biosphere não sabe conduzir suas personagens em cenas cômicas, resultando em cenas desmotivantes e truncadas recheadas de piadas sem graça, oriundas de uma relação entre duas personagens que estão unidas há muitos anos, e que verbalizam constantemente sobre sua forte conexão, mas que nunca convencem realmente disso. Quando tenta fazer rir, Biosphere esquece de ser natural, evidenciando o tempo todo de que estamos acompanhando uma grande farsa.

E é nessa falta de naturalidade que Sterling K. Brown se destaca. Mesmo nos diálogos mais fracos e superficiais, o ator consegue extrair emoção e naturalidade, é claro, na medida do possível desenhada pelo limitado texto do filme. Já admirava Sterling há algum tempo, e agora, ao vê-lo tirar leite de pedra de um argumento tão fraco, passei a considerá-lo ainda mais. Grande ator.

Agora, antes de terminar meu raciocínio e pular para a conclusão, devo ressaltar que o argumento, apesar de seus problemas, apresenta alguns assuntos interessantes em sua trama, às vezes de forma mais rasa, mas outras com profundidade. Temas como virilidade, machismo, homofobia, evolução e até identidade de gênero raspam a superfície de Biosphere, e, felizmente, são tratados de forma madura e inteligente, diferente do sofrido humor apresentado no filme. Uma pena o filme não perceber que sua verdadeira força mora aqui, e não no tentar fazer rir com bobagens e exageros.

A premissa de Biosphere é boa, entretanto, a execução deixa a desejar. Entre algumas boas ideias e uma abordagem de humor falha, o filme nunca atinge seu verdadeiro potencial. Sterling K. Brown está ótimo, como de costume. Mark Duplass é irritante e pouco natural. Não há um real equilíbrio entre a comédia e a ficção científica, e a dupla de protagonistas pouco convence com sua dita forte amizade. Decepcionante é uma boa palavra para descrever Biosphere.


Biosphere
Biosphere

ANO: 2022

PAÍS: EUA

DURAÇÃO: 1h 46min

REALIZAÇÃO: Mel Eslyn

ELENCO: Sterling K. Brown, Mark Duplass

+INFO: IMDb

Biosphere

Previous ArticleNext Article

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *