O género whodunit está a ter uma nova vida. Murder on the Orient Express, o primeiro filme com Kenneth Branagh na realização e também no papel de Hercule Poirot foi importante para tal, mas Knives Out elevou muito a fasquia dois anos depois. Agora, Poirot regressa e com ele Branagh a repetir todas as tarefas que tinha tido a seu cargo no capítulo anterior. A acompanhá-lo vem um elenco de luxo, composto pelo regressado Tom Bateman, Gal Gadot, Armie Hammer, Rose Leslie, Sophie Okonedo, Letitia Wright, Emma Mackey e Russel Brand, entre outros.
A maioria de nós já muito conhece sobre a personagem de Agatha Christie, mas Branagh procura dar aqui uma nova camada à personagem de Poirot. Isso vê-se na cena inicial – Branagh, pelos vistos, adorou o preto e branco, repetindo a dose de Belfast! – mas acompanha a personagem durante toda a duração do filme, com o amor a ser o grande tema da personagem e do filme. Claro que o filme tem uma morte no Nilo. Ou mais. O título entrega isso e até é bem provável que já tenham visto o episódio antigo da famosa série do detetive. O que esse episódio não vos mostrou tão bem é o quão belos estes cenários são.
O trabalho cinematográfico está a um bom nível, mas é quase impossível fazer um mau trabalho com o Egipto, a sua beleza natural e as suas cores como pano de fundo. Há, ainda assim, sets muito interessantes a destacar, como o que envolve a queda de uma gigantesca e histórica peça, sem esquecer o belo barco que nos acompanha em todo o percurso. Branagh é também hoje um bem melhor realizador do que o era aquando do primeiro filme e faz uso de vários recursos para nos dar diferentes perspectivas, para colocar a câmara em ângulos pouco usuais ou para utilizar o movimento da mesma de uma forma adequada ao que pretende transmitir. A história onde se inspira é também forte e a forma como Poirot – excelentemente interpretado por Branagh – chega à revelação final é bem construída. Todo o grande leque de atores está a um bom plano e o que alguns não desenvolvem na sua atuação, entregam em carisma.
No entanto, nem tudo corre bem. Em primeiro lugar, Death on the Nile leva – e nada contra isso – o seu tempo a estabelecer-se, mas, fá-lo em demasia. Eu percebo que é uma história que envolve um certo background para nos tentar vender as personagens e suas motivações, mas isso associado à cena inicial no passado de Poirot parece-me exagerado. Talvez a cena pós-créditos iniciais devesse ser pré-créditos e talvez a que temos antes, na guerra, seja desnecessária para todo o contexto (tudo talvez tivesse resultado melhor com flashbacks unicamente da cena do hospital, por exemplo).
Tenho também problemas com a previsibilidade do desfecho final. Ainda que Poirot revele bastante bem como chegou à sua conclusão, mentiria se dissesse que as minhas suspeitas não estavam ali desde o preciso momento em que soube quem tinha morrido, tendo sido feito pouco para afastar essas fortes suspeitas. Há também subplots que me parecem em demasia e muito pouco explorados, sendo difícil de justificar a sua existência neste formato. Acredito que num livro estes sejam importantes, ajudando a explorar devidamente as personagens e suas motivações. Numa obra cinematográfica, no entanto, têm pouco espaço para criar qualquer impacto. É-nos entregue e, de imediato, colocado de lado.
Sucintamente, Kenneth Branagh é um excelente Hercule Poirot, as personagens são intrigantes e os cenários e valores de produção valem por si só o bilhete. Ainda assim, Death on the Nile sofre de um primeiro ato demasiado longo e de um desfecho bastante previsível. Irá entreter os fãs de mistério, mas, por vezes parece andar quando deveria correr e correr quando deveria andar, o que provoca problemas de desenvolvimento e exposição.