Father Stu prega a quem já não precisa

Há filmes que querem ser feel-good e tocar no coração. Há filmes que querem passar mensagens positivas. Há filmes que querem ser inspiradores. Father Stu quer ser isso tudo e poderá convencer um certo público, mas dá sempre a sensação de estar a pregar a quem já não precisa de ser pregado.

Antes de mais, falar da história na qual se inspira. A história é a de Stuart Long, um ex-atleta, um ex-lutador, com um passado conturbado, que se comporta como um criminoso sempre que tem oportunidade para tal. Um certo dia, um acidente de viação tudo muda. Sofrendo lesões que, segundo os seus médicos, deveriam ser irrecuperáveis, Stuart sobreviveu. Não só sobreviveu. Stuart converteu-se num homem novo, batizou-se por amor, mas percebeu que os planos de Deus eram outros e preferiu fazer-se padre, renunciando a esse amor. Mas isto não fica por aqui: quase no final da sua formação para padre, Stuart descobriu sofrer de uma doença rara, que o iria inabilitar de fazer quase tudo, menos de seguir o seu sonho e de estar mais próximo de Deus, ajudando as pessoas!

Há obviamente aqui muito para ser contado e muito do aqui se passa poderá ser verídico, embora muito também seja de carácter dúbio (nomeadamente o chamamento divino, que é mostrado de forma literal no filme de forma algo patética). Aceito que muita da nossa aceitação em relação ao que nos é contado passará também pela nossa fé e crença em milagres. Confesso que não sou religioso. Confesso também que, ainda assim, aprecio um bom filme de qualquer género ou tema. Um bom filme. Father Stu não é um bom filme.

É fácil de perceber que esta é uma história complexa – onde ainda temos que colocar pais abusivos e com uma relação totalmente tóxica – que é difícil de ser contada de forma efetiva em duas horas. Como desenvolver todas estas relações e todas estas diferentes histórias em paralelo? Não tenho a resposta, mas é claro que Rosalind Ross – que escreve e realiza, além de ser a companheira de há vários anos de Mel Gibson – também não o sabe. Tudo se tenta encaixar e pouco é explorado em profundidade. A relação de Stu (Mark Whalberg) com o pai (Mel Gibson)? Super superficial. Mas…calma. No terceiro ato lembraram-se que tal tinha sido pouco explorado e resolveram enveredar pela exposição pura e dura, como se nos fossemos importar agora. A relação de Stu com a mãe (Jacki Weaver)? Ainda menos explorada. As personagens são tão unidimensionais que nem conseguimos percebê-las como pessoas. A relação de Stu com a sua namorada (Teresa Ruiz)? Tão abruta ao desaparecer como o foi a desenvolver-se. A relação de Stu com a fé? Bem, apenas posso dizer que tudo acontece tão depressa que se perdermos 10 minutos do filme nem entendemos como ali chegamos.

A montagem do filme não ajuda. Muitas cenas arrastam-se sem necessidade, mas mais ainda são aquelas que acabam abruptamente, ecoando na nossa cabeça um “and…cut”, como se estivéssemos no próprio estúdio. Tudo isto é, ainda assim, tolerável porque queremos torcer por Stu e porque Wahlberg faz um bom papel, sobretudo na reta final do filme. Dá para entender que ele queria fazer muito disto, que queria que isto fosse um filme memorável, apesar de tudo – acompanhado por uma deprimente e genérica composição musical – ser bem esquecível e banal, funcionando certamente melhor numa aula de seminário do que numa aula de cinema.

Mark Wahlberg é melhor ator do que muitos afirmam e perto do final mostra o que poderia ter feito com um guião mais inteligente e com mais nuances. Há por aqui uma história inspiradora, mas este é um filme que falha em encaixar as suas peças. No final, isto sabe a pouco mais do que forte propaganda religiosa.


Father Stu
Father Stu

ANO: 2022

PAÍS: EUA

DURAÇÃO: 124 minutos

REALIZAÇÃO: Rosalind Ross

ELENCO: Mark Wahlberg; Mel Gibson; Teresa Ruiz; Jacki Weaver; Malcom McDowell

+INFO: IMDb

Father Stu

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