Chegou ao final a trilogia Fear Street da Neflix, com a estreia da parte 3: 1666. Tal como aconteceu no 2º filme, a ação leva-nos a um tempo ainda mais distante no passado (como o próprio título indica) e mostra-nos o que realmente aconteceu com Sarah Frier e a origem da maldição que tem assombrado a cidade de Shadyside. Tal como nos dois primeiros filmes, nem tudo é perfeito neste 3º capítulo, mas já lá vamos.
Comecemos pelas coisas boas desta parte 3. É o terceiro capítulo de uma trilogia e, como tal, existem sempre receios que fiquem pontas soltas e que não se desvendem todos os mistérios da história que têm para nos contar. Felizmente, Fear Street mostrou-se exemplar nesse aspeto. Já a parte 2 (a minha favorita) tinha avançando bastante a história, desvendando mais um pouco do mistério e a parte 3 une tudo o que há para unir, mostrando-nos, de forma clara, em cena, a origem do “mal” na cidade, assim como os paralelismo entre a história de Deena no presente com a de Sarah no passado. Percebe-se, claramente, que o círculo se fecha e, embora a cena pós-créditos deixe em aberto a possibilidade de mais material derivado, esta – a acontecer – já deverá ser uma história totalmente nova, com pouca ligação ao que vimos nesta trilogia.
Este capítulo volta, também, a apresentar-se muito certeiro no que diz respeito às mortes no ecrã, sendo esse um dos pontos fortes da trilogia: é um terror para adolescentes que não trata os adolescentes como crianças, sabendo bem o que eles querem ver em cena (mesmo que seja para maiores de 18 anos…todos já fomos adolescentes e sabemos como é!). Outro ponto bastante positivo nesta saga, e em especial neste filme, é a representatividade, a diversidade e a honestidade em colocar no ecrã uma história de amor adolescente lésbico que parece real, não censurada, sem problemas em mostrar os vários desafios que daí resultam, seja em que período temporal estejamos. Sei que muitos gritarão “demasiado woke” aos sete ventos, mas tudo o que aqui é feito, é feito com sentido, com propósito e de uma forma bastante bem trabalhada, sem parecer que está cá apenas para cumprir quotas.
Agora vamos ao que não resulta. A escolha de colocar as atrizes da parte 1 a representar outros papéis em 1666 é explicável, mas não resulta. Preferia – tal como feito na parte 2 – que tivessemos tido um outro cast durante esse período, até porque é totalmente impossível dissociar certos tipo de falas e comportamentos com os que já anteriormente tínhamos vistos desses atores num tempo futuro. Talvez devido a isso, nunca tenhamos um real feeling de que estamos em 1666. Sim, eu não vivi na época, e, sim, é muito mais fácil reproduzir a década de 90 ou o final da década de 70, pois a maioria dos que a viveram ainda por cá andam. De qualquer forma – e apesar de a nível de guarda-roupa ser feito um bom trabalho – grande parte do diálogo a que assistimos não é minimamente credível que pudesse ter acontecido na época narrada. E, já agora, também os sotaques das personagens estão muito aquém da perfeição.
Também convém referir que a primeira parte deste capítulo não resulta tão bem também porque é, manifestamente, aborrecida. O romance, o melodrama e o diálogo cheesy tomam, várias vezes, posição primordial e o filme esquece-se do terror. Melhora no final desse período temporal, mas melhora ainda mais quando o filme surpreende – com quase 50 minutos pela frente – e volta a 1994 – o presente – para nos fechar a trilogia. Aqui volta-se a perceber que Leigh Janiak está muito mais confortável em 94 (ou 78) e esta conclusão resulta em várias cenas marcantes, no centro comercial, construído após os eventos de 78. Kiana Madeira e Benjamin Flores sentem-se também muito mais em casa e o acting deixa de ser um problema – excepção feita a Gillian Jacobs que nos dá uma pouco convincente Ziggy adulta, sendo difícil ver aquela como a personagem que um dia foi a interpretada por Sadie Sink. Nesta conclusão, temos ainda direito a uma espetacular cena que passa no ecrã, de forma rápida, todas as mortes da trilogia e uma outra cena que faz uma referência óbvia e muito bem conseguida aos livros que serviram de material de origem.
Fear Street é uma trilogia que pode ajudar a redefinir as fronteiras entre televisão e cinema e a Netflix tem em mãos uma mina de ouro da qual dificilmente abdicará. Esta Parte 3 é mais fraca que os dois capítulos anteriores, tomando alguns caminhos errados, mas, ainda assim, recompõe-se para fechar de forma satisfatória uma trilogia que voltou a colocar o terror adolescente na moda.