Filmes sobre animais falantes não costumam ser ótimos, por isso, eu fui sem quaisquer expectativas para Strays. Apesar de já terem passado 24 Horas desde que vi o filme, ainda me pergunto: será este um bom filme ou um mau filme? O filme aborda temáticas importantes, como o abandono e as relações tóxicas, o que sinto que é bem representado na maioria. Por outro lado, o humor mais ordinário, só me dá vontade de parar de ver o filme. Críticas à parte, o filme conta a história de Reggie (Will Ferrell), um ingénuo e otimista cão, que é abandonado por Doug, o seu insensível e rude dono, embora este continue convencido de que o seu melhor amigo nunca o abandonaria intencionalmente. No entanto, assim que Reggie conhece um cão de rua chamado Bug (Jamie Foxx) – que adora a sua liberdade e acredita que os donos não prestam para nada juntam-se a eles ainda uma cadela doméstica e um cão de ajuda, para uma viagem cheia de reviravoltas com o fim de se vingarem de Doug.
Reggie (Will Ferrell) é um personagem principal que cativa facilmente o público devido à sua ingenuidade e simpatia. Com a sua sinceridade e pureza,torna-se uma presença genuína e autêntica na narrativa. A sua inocência é palpável em cada ação e palavra, fazendo com que seja fácil para o espetador se identificar e torcer por ele. A ingenuidade de Reggie cria momentos de comédia (bastante carregados pela dobragem incrível do Will Ferrell), ternura e empatia, tornando-o um personagem ótimo de se acompanhar. E não é só Reggie que é bom personagem, mas os seus companheiros de viagem Maggie e Hunter também o são. Maggie (Isla Fisher) é uma personagem doce e meiga que ajuda emocionalmente os seus companheiros quando é preciso, mas também carrega uma valência, pouco usada ao longo do filme. O personagem Hunter (Randall Park) não é muito diferente de Maggie, os dois tem um lado carinhoso, que faz sentido em Hunter, pois o mesmo é um cão de companhia. No entanto, Hunter é pouco mais do que isso, mostrando o seu lado valente apenas no final do filme, o que cria um arco pouco importante e na maioria desperdiçado ao longo da narrativa. Mas na minha opinião o melhor personagem, de longe, é Doug (Will Forte). O guião constrói comportamentos e atos do personagem que nos fazem acreditar nas suas ações e nos faz ter um certo ódio pelo seu personagem. E quando as consequências chegam, nós, audiência, ficamos felizes. O seu personagem é acompanhado por uma atuação incrível que só torna tudo credível, e nunca parece um personagem falso, que só está lá para dizer que está. Mas o prémio de pior personagem vai para, o Bug (Jamie Foxx). Bug é o personagem mais irritante devido às suas piadas nojentas e ordinárias que te deixam enjoado do personagem. Ao menos, o Jamie Foxx faz um ótimo trabalho a dobrar o cão mais chato do mundo.
Provavelmente, o ponto mais detestável deste filme é o seu humor, que como eu já referi é bastante ordinário em 90% do filme. As piadas tinham sempre relação com “sexo; “pila”; cocó”; “chichi”; etc. Chega a ser previsível após 10 minutos a próxima piada. O motivo do meu ódio para com este humor não é por ser direcionado para adultos, pois eu adoro filmes com esse estilo de humor. Um exemplo onde esse tipo de piadas funcionam, é o The Wolf of Wall Street. Ambos os filmes têm mais ao menos, a mesma base humorística, mas com uma grande diferença, o filme de Scorsese resulta. Em The Wolf of Wall Street o humor mais adulto é moderado, tendo momentos onde as piadas focam-se noutro assunto. Quando aparecem as piadas para adultos, elas resultam, pois estão no timing certo, e não são apenas jogadas como em Strays. Neste filme parece que não há diversidade em termos de humor, como já disse, 90% são piadas sobre “sexo; “pila”; cocó”; “chichi”; etc. sendo um filme de comédia o filme falha ao não tentar explorar outros temas para satirizar. Peguemos noutro filme, Deadpool. O filme tem, sim, um forte humor adulto, mas o mesmo explora, de maneira excecional, outros temas para satirizar. No entanto, quando Strays tenta fugir das piadas adultas, não foge muito, costumam ser piadas tão rasas e vazias, que muitas passam bastante ao lado e nem nos apercebemos. Ainda assim, nem todas as piadas são más. O momento em que mais ri, foram os 5 minutos iniciais, pois é logo aí que percebemos as duas perspetivas da relação de Reggie e Doug, descobrindo-o com uma narração excecional de Will Ferrell. Neste conjunto de cenas, ouvimos Reggie a dizer o quão bom a sua relação com Doug é, e como o seu dono é perfeito, mas com recurso a calão que, em filmes mainstreams, teria de ser censurado.
Strays tem vários defeitos, mas o que para mim é a melhor coisa deste filme é a maneira como o guião de Dan Perrault antropomorfiza os seus personagens (dando características humanas a seres não humanos). Adoro a maneira como o filme transforma os cães em humanos, dois bons exemplos é quando o personagem Reggie é abandonado. A maneira como a realização, junto do guião, mostra e transforma Reggie num vagabundo, numa cena em que ele passa numa rua é abordado por prostitutas e quase que é assaltado, tu consegues ver isso em qualquer filme com seres humanos, por momentos tu esqueces até faz esquecer que falamos de cães. Outro bom exemplo, é quando os cães ficam sob efeitos de drogas e cometem atos terríveis e, tal como humanos fariam, tentam esconder o que fizeram. De seguida, são abordados pela polícia, mas, como são cães, eles são abordados por cães policias, criando-se um mini arco bastante engraçado à volta disso.
Outro aspeto que pode fazer com que assistir ao filme seja uma má experiência é a, animação da boca dos animais, que é bastante irregular, variando entre o bom e o terrível. O problema é quando a má animação se junta à movimentação esquisita e não realista dos cães, isto tudo resulta em momentos estranhos ou apenas assustadores. Apesar de todas as críticas, este filme pode divertir, só se tiveres a lavar a loiça – e graças ao som da água faz com que não escutes nada, nessa situação eu recomendo à grande Strays.