Quando me apercebi da existência deste filme, duvidei muito dele. Era uma adaptação de um videojogo que não parecia adaptável ao cinema. Na realização estaria Neill Blomkamp que nunca mais esteve ao nível da sua estreia, com District 9, e que mais recentemente nos deu o horrível Demonic. Além do mais, mudava substancialmente de género, parecendo que o realizador vinha apenas pela componente financeira. O elenco não me transmitia também uma cega confiança – o ator principal, por exemplo, era quem menos me tinha agradado no elenco da série See – e os trailers que foram saindo não me encheram as medidas. Cheirava a flop por todos os lados! Mas não flop no sentido financeiro, como os norte-americanos gostam de chamar (para os nativos de tal país, o dinheiro é que decide tudo e como tal esse é o indicador único de sucesso). Não, um flop mesmo a nível qualitativo.
O início do filme é um pouco confuso. A edição parece, nesta fase, pouco cuidada. Saltamos de sítio para sítio sem perceber muito bem porquê e temos dificuldade em conectar com uma situação que envolve um potencial interesse amoroso que nos diz absolutamente zero. Felizmente, esta fase de “apalpar terreno” dura pouco. Assim que o nosso personagem principal, Jann (Archie Madekwe) faz o seu teste no jogo…perdão, no simulador Gran Turismo, tudo isto se torna muito mais interessante. De imediato, somos atirados para o meio de uma espécie de recruta, onde se encontram os melhores jogadores de Gran Turismo de todo o mundo e aí é o “salve-se quem puder”! No final, vence apenas um, numa verdadeira batalha pela sobrevivência para descobrirmos quem é O melhor jogador do plano, pessoa que irá ter direito a treinar e competir como piloto profissional.
O argumento parece rebuscado, mas, por incrível que pareça, a história real na qual o filme se baseia é bastante próxima. Isto aconteceu mesmo! E mesmo que nunca explore componentes mais reflexivas que poderia explorar, o filme consegue sempre cumprir a sua função principal: entreter. E muito. A dinâmica criada por Jann e Jack Slater (Dave Harbour) é espetacular, tem alma, tem coração e Dave Harbour é bem capaz de ser o melhor ator neste filme, com uma interpretação muito sincera e com um bonito arco. Djimon Hounsou e Orlando Bloom também trabalham bem os seus diferentes papéis – Hounsou vive o pai de Jann e Bloom o “confiançudo” responsável pela ideia – dando-nos ambos sempre algo com que nos identificar.
Mesmo quando o filme opta por uma certa lamechice desnecessária. Destaco, por exemplo, uma péssima cena que parece de filme feito diretamente para televisão, cena em que Jann mostra a cidade ao seu interesse amoroso de uma forma completamente vazia e azeiteira. Qual foi o objetivo? Fiquei sem saber, até porque não se desenvolve grande coisa dali. Aliás, toda a relação amorosa do filme não tem qualquer importância para esta história, parecendo ali colocada à pressão por se terem dado conta de que faltava algum toque feminino a isto.
Mas há um ponto muito positivo: a adrenalina. É obrigatório referir a mesma porque é que aquilo que nos faz subir a pulsação nos momentos de maior tensão. É até curioso que baseando-se num jogo que sempre primou pela sua componente realística e próxima da verdadeira condução, tenhamos agora também um filme que nos faz mesmo sentir que ali estamos, dentro daquele carro, naquela perpspetiva. E que bem que o filme conjuga os aspetos técnicos da condução com o seu sentimento mais palpável!
Gran Turismo é, acima de tudo, aquilo que deveria mesmo ser. Parece um produto feito apenas se aproveitar de uma marca e tirar-nos algumas notas das nossas carteiras, mas Neill Blomkamp fez um trabalho muito competente, sabendo como nos divertir. Nem tudo é perfeito, mas tudo aqui nos faz lembrar o perfeito filme de sábado à tarde, daqueles que marcaram a nossa infância, nos tempos em que a televisão portuguesa ainda se importava com algo mais do que pimbalhada.