Este La Llorona é o bom!

Antes de mais, convém não confundir este título com The Curse of La Llorona, uma versão de terror de Hollywood, baseada na mesma lenda. Aqui falamos de um filme da Guatemala, de Jayro Bustamante, que tem uma abordagem totalmente diferente à lenda da mulher que chora. É até difícil classificar “La Llorona” como um filme de terror. Nos primeiros dois actos do filme, o mesmo funciona como um drama político, embora esteja sempre no ar uma atmosfera tensa, de que algo não está bem e que ainda ficará pior.

A história do filme fala-nos de um ex-ditador guatemalteco, que, durante os seus anos de poder, usou esse poder, através da força, destruindo vidas e sonhos dos povos indígenas. A trama avança até aos tempos atuais, onde, após ter sido, inicialmente, considerado culpado de genocídio e crimes de guerra, Monteverde livra-se da sua sentença através de uma tecnicalidade, podendo regressar a casa. E é aí, na casa do abastado ex-ditador, rodeada de enormes protestos de populares que não concordam com a decisão judicial, que, praticamente, toda a ação se desenvolve. A chegada de uma nova empregada a casa traz consigo uma série de estranhos eventos, que narrativa e simbolicamente, se encaixam perfeitamente naquilo que o filme pretende transmitir, servindo de alegoria para problemas comuns em várias ditaduras centro e sul-americanas, nomeadamente a corrupção e o abuso de poder. 

Claro que para que isto funcione, é necessário que quem nos passa essa mensagem seja convincente e esse é outro dos pontos mais fortes de “La Llorona”. Se é verdade que a realização e edição são do melhor que se faz pelo mundo fora, as mesmas de pouco valeriam se os atores não estivessem à altura. E aqui é fácil (e justo!) destacarmos Maria Mercedes Coroy, como Alma, que rouba o filme cada vez que aparece no ecrã, no papel da enigmática nova empregada da casa. A atriz que tinha já conquistado elogios na sua estreia, no anterior filme de Bustamante (Ixcanul), tem aqui um papel completamente diferente, mas, pelo menos, igualmente, convincente, com poucas falas, mas com uma expressividade tremenda.

No entanto, se Mercedes Coroy é a grande estrela, é impossível não destacarmos outras duas grandes interpretações femininas. Um delas é Sabrina de La Hoz, que, no papel de filha do ditador, se questiona acerca do passado do seu pai e se, de facto, o seu pai é um homem bom, transpondo para a tela as suas dúvidas e o seu conflito interior, de forma perfeita. A outra é a veterana Margarita Kenéfic, no papel de Carmen, a esposa do ditador, que, apesar de ter interiorizado o que o seu marido um dia foi (ou é), tendo sempre protegido as suas atitudes, não consegue esconder um certo sentimento de culpa, que se reflete nos seus terrores noturnos.

Se é verdade que a construção, propositadamente lenta e pensada, funciona bastante bem na forma como o filme se desenvolve e no ambiente do mesmo, também é verdade que esse ritmo permite-nos chegar, antecipadamente, a algumas conclusões, que podem ser previsíveis para muitos. De qualquer forma, essa previsibilidade – que até pode ser considerada como o ponto mais fraco do filme – é perdoada por uma conclusão praticamente perfeita, que não se limita a ser bastante eficaz do ponto de vista cinematográfico, trazendo também consigo importantes mensagens políticas e, acima de tudo, sociais.

Não é um filme para todos e irá desagradar a todos os que procurem um filme de “susto fácil” ou apenas um filme de terror puro e duro. La Llorona é muito mais do que isso: é um drama familiar político, com uma forte mensagem social, que nos mostra o lado de opressores e oprimidos ao longo da história e as suas consequências. Tudo isso, temperado com subtis e inspirados momentos atmosféricos de terror, tornam “La Llorona” numa visualização mais do que recomendada.

 


La Llorona
La Llorona

ANO: 2020

PAÍS: Guatemala

DURAÇÃO: 97 minutos

REALIZAÇÃO: Jayro Bustamante

ELENCO: María Mercedes Coroy, Sabrina De La Hoz, Margarita Kenéfic, Julio Diaz

+INFO: IMDb

La Llorona

Next Article

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *