Morbius morde muito pouco

Enquanto aguardava o início da sessão e já depois de todos os infindáveis trailers e anúncios, o alarme de incêndio tocou e todas as salas de cinema foram evacuadas. Este foi o momento mais emocionante da minha noite naquilo que eu deveria ter entendido como um sinal divino.

Começo de uma forma direta: Morbius não é um bom filme. O filme começa com estranhos saltos temporais – três tempos, na verdade -, mas, pelo menos, apresenta-nos bonitas paisagens e mostra-nos alguns acontecimentos que nos deixam relativamente expectantes para o que daí poderá advir. Cedo percebemos que a doença do Dr. Morbius e as suas conflitualidades internas na busca pela cura serão parte fundamental do filme. Cedo percebemos também que a sua amizade e diferenças de opiniões para com Lucien – com quem cresceu, vendo-o como um irmão – irão pesar no que é o enredo e o desfecho deste filme.

Já que falamos de Lucien, é importante referir que Matt Smith é, em largos momentos, a melhor coisa deste filme. Apesar de tudo ser contado de um modo super apressado, percebe-se as suas motivações e o ator trabalha bem com o material que tem até…cair na armadilha de tentar demasiado e tornar-se numa caricatura de si mesmo, talvez por perceber que não dava para extrair muito mais do que para si tinha sido escrito. Quanto a Leto como Morbius, não serei um dos maiores detratores. Acho que esse não é o problema. A atuação de Leto varia entre o banal – podendo estar lá outro qualquer ator – e alguns momentos em que se consegue perceber que dentro dele há espaço para mais e para dar uma maior profundidade à personagem. Mais uma vez, parece que quer mais de umas calças que têm bolsos demasiado curtos.

Contei dois bons momentos em Morbius: os dois momentos são utilizados back-to-back, no hospital e na prisão, funcionando relativamente bem em termos de tensão e entusiasmo, estando bem acima do que o filme apresenta na generalidade. E ficam por aqui os pontos positivos. A banda sonora tem alguns laivos de superioridade e onde está próxima de se destacar, mas cai na esparrela da repetição, sendo usada e abusada a cada momento do filme. Confesso que não me lembro se existem 30 segundos que sejam sem música de fundo, não havendo qualquer espaço para o material respirar. A fotografia é suja e banal, procurando uma tonalidade negra – mais características dos filmes da DC – que não resulta, pois não tem nada que a faça sobressair. No entanto, o pior mesmo é a história e o guião.

Procurando ter algo para dizer sobre os limites da ciência, sobre o comportamento humano ou sobre a evolução das nossas relações, Morbius falha em todos esses aspetos, ficando sempre a meio caminho. A relação entre Morbius e Lucien – ou Milo como é chamado – tem um enorme potencial, mas é incrivelmente mal aproveitada por um guião que parece escrito às três pancadas, com muito pouco espaço para a construção motivacional dos acontecimentos. A química entre o principal par amoroso é totalmente inexistente e mesmo os momentos que deveriam pedir um maior choque emocional deixam-nos totalmente indiferentes. Por outro lado, espaço não falta para a sobre-exposição no diálogo, deixando-nos cansados de tanta repetição e pouco desenvolvimento.

Muitas vezes me queixo dos filmes de super-heróis serem sempre sobre o “fim do mundo”, mas aqui sinto que Morbius falha pelo oposto: por nunca nos conseguir interessar muito por uma história que parece muito limitada no seu espaço e nas suas barreiras. Nada ajuda também que a realização e a edição sejam bastante questionáveis, com um excessivo uso de planos fechados e close-ups e um claro desequilíbrio entre cenas demasiado curtas – quando pediam para serem mais longas – e cenas demasiado longas, onde nada há para extrair.

Morbius é um dos maiores exemplos de um filme que nos é entregue sem existir qualquer crença no próprio produto. Um guião fraco e com poucas ideias que nunca consegue atingir o potencial que uma história de vampiros adaptada de uma banda desenhada claramente tem. É um tiro completamente ao lado.


Morbius
Morbius

ANO: 2022

PAÍS: EUA

DURAÇÃO: 104 minutos

REALIZAÇÃO: Daniel Espinosa

ELENCO: Jared Leto, Matt Smith, Adria Arjona, Jared Harris, Tyrese Gibson

+INFO: IMDb

Morbius

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