MOTELX: A Semente do Mal, Superposition e Smother

Continuando a nossa cobertura ao MOTELX deste ano, falamo-vos hoje de dois filmes grandes deste sábado e outro que não nos agradou tanto nos primeiros dias do festival. O grande destaque, claro, a estreia europeia do novo filme de Gabriel Abrantes!

A Semente do Mal

A Semente do Mal IMDB

Realização Gabriel Abrantes
Elenco Carloto Cotta, Brigette Lindy-Paine, Alba Baptista, Anabela Moreira
País: Portugal

 

Depois do alucinado Diamantino, Gabriel Abrantes optou por um filme de terror mais convencional. Como fã de terror, só lhe posso agradecer. E para primeiro trabalho no terror…não é nada mal começar-se com uma das melhores obras do género em língua portuguesa. Na história, Edward (Carloto Cotta) vive descansadinho com a sua namorada, Ryley (Bridgette Lindy-Paine), em Nova Iorque. Em busca da sua família biológica, Edward acaba por descobrir ter um irmão e a mãe em Portugal. Chegando cá com Ryley, percebe que descobrir as origens pode ser algo bastante perigoso.

Há aqui um trabalho muito bom na introdução da trama e criação do mistério. O filme começa com uma forte cena de abertura no passado (com Alba Baptista como a jovem mãe) e depois, já no presente, começa por nos apresentar de forma completa (mas sem ser demasiado expositiva) o casal principal. Estas são mesmo as duas personagens melhor construídas, mais redondas e para isso muito contribui o excelente trabalho de Carloto Cotta (aliás, com duplo papel distinto) e de Brigette Lindy-Paine, que chega a carregar o filme bem mais do que seria de esperar, sendo sempre ela a personagem que junta as várias peças do enredo. Há ainda a destacar o excelente trabalho de Anabela Moreira, que, mesmo coberta de maquilhagem, consegue brilhar no papel da personagem mais enigmática, a mãe dos manos.

A forma como Abrantes trabalha o género é muito interessante, acrescentando algumas pitadas de humor (embora parte da audiência parecesse pensar que isto era apenas e só uma comédia) a temas de folclore tradicional português, introduzindo ainda comentário social relacionado com a família e relações amorosas.

A banda-sonora é excelente, bem como todo o trabalho de efeitos sonoros. Do ponto de vista visual, salta à vista o excelente design de produção (os espaços interiores parecem obras de arte), a excelente maquilhagem e a fotografia, com destaque para as cenas mais sombrias. Por vezes, o filme abusa de alguns clichés do género – várias personagens a seguir vozes no escuro, sonhos dentro de sonhos e mais sonhos -, mas consegue sair por cima através da forma como sempre consegue entreter, deixando-nos interessados e concluindo com um excelente final.

Superposition

Superposition IMDB

Realização Karoline Lyngbye

Elenco Marie Bach Hansen, Mikkel Boe Følsgaard 

País: Dinamarca

Superposition é um daqueles filmes dos quais me vou recordar várias vezes no futuro. É um daqueles que fazem refletir, colocando questões e deixando-nos a pensar sobre potenciais escolhas mesmo depois de terminada a sua visualização. E fá-lo sem que nos dê respostas fáceis. Vou-vos dar a sinopse oficial, pois acredito que é importante ir para este filme o mais “cego” possível: o casal de intelectuais, Stine e Teit, trocam Copenhaga e os confortos da vida urbana com o seu filho, Nemo, por um refúgio sustentável numa floresta Sueca. A sua esperança é reacenderem a chama no seu casamento e redescobrirem-se como indivíduos, enquanto documentam o seu novo lifestyle num podcast. Mas, um dia, Nemo desaparece na floresta e quando Stine o reencontra, a criança, assustada, insiste que ela não é a sua mãe.

Apesar de ter um primeiro ato um pouco errático a nível de ritmo, demorando a mostrar as suas cartas, a partir do momento em que o “evento” se dá, este é um filme bastante interessante. Primeiro, vai por uma porta de maior choque, abrindo outra de maior diálogo, mas talvez ainda não seja por aí que vai…perceberam? Não faz sentido, porque a verdade é que Superposition também pode ser confuso e, acima de tudo, é um filme do qual revelar os seus dispositivos narrativos é pecado. Há a destacar o bom trabalho argumentativo e tudo o que coloca em cima da mesa em termos de comentário social e relacional. Não se esqueçam de quem está ao vosso lado, não se esqueçam de comunicar, não se esqueçam de se encontrarem a vós próprios, antes de unirem esforços para um futuro em conjunto. Poderoso emocionalmente e com um pesado ato final que encaixa na perfeição na sua trama e temáticas abordadas.

Smother

Smother IMDB

Realização: Achmed Abdel-Salam

Elenco: Cornelia Ivancan, Lola Herbst, Lukas Turtur

País: Áustria

Smother fala-nos de trauma e para tal faz o que tantos filmes do género têm feito nos últimos tempos: utiliza a relação entre mãe e filha como elemento narrativo primordial, refletindo sobre o trauma que explica ações presentes.

O maior problema de Smother é que é poucochinho. As atuações são muito boas – em especial a de Cornelia Ivancan no papel principal – e os valores de produção estão também a um nível elevado. Os seus planos abertos são deslumbrantes e nota-se que se pretendeu dar alguma elevação artística a esta obra através de alguns diferentes planos de filmagem. Acontece que a nível dramático, sendo competente, nunca se eleva para além do que já vimos em vários filmes do género. Pior, é muito pouco trabalhado ao nível dos elementos de terror, parecendo que a decisão de os encaixar foi tomada à última da hora.

É previsível e será rapidamente esquecido, apesar de ter o coração no sítio certo e de ter deixado a ideia de que poderia ter sido um filme de maior qualidade se tivesse entendido um pouco mais a sua dimensão de terror.

Previous ArticleNext Article

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *