Um filme básico para um evento absurdo. Nyad conta a história real de Diana Nyad, a nadadora de 64 anos que atravessou, em 2013, 164 km a nado, de Cuba à Flórida. O feito é incrível, mas o longa da Netflix nunca alcança seu potencial cinematográfico, por mais que trate muito bem suas personagens e seja, afinal, um bom entretenimento.
Nyad é essencialmente extremo. Diana Nyad (Annette Bening) tem como objetivo uma jornada exaustiva de aproximadamente 60 horas de nado em mar aberto. São quase três dias nadando sem parar, enfrentando frio, exaustão, animais marinhos, entre outras complicações. Dos treinos mais simples, às diversas tentativas de concluir o feito: tudo o que toca essa história beira a intensidade absurda. Porém, ainda assim, o filme decide ser super simplório, quase inexpressivo, pelo menos em termos de ação.
A verdadeira aposta de Nyad fica com a descontração e a leveza e, por mais pareça destoante do enredo, a proposta faz bem ao longa. Diana Nyad é egocêntrica e obsessiva, e o filme faz dela uma personagem divertida e curiosa de se acompanhar. Divertida também é a relação entre a protagonista e sua treinadora e melhor amiga, Bonnie Stoll (Jodie Foster). As duas cultivam uma amizade baseada em um intenso companheirismo, onde ambas apoiam uma à outra, apesar de viverem uma eterna discussão de relacionamento, onde críticas e provocações são disparadas a todo momento. A dinâmica entre as duas, e, posteriormente, entre os demais envolvidos na exaustiva missão, é apresentada com muito carisma, e desenvolvida organicamente.
Mas, por mais que tal leveza encaixe bem em Nyad, é uma pena que sua intensidade seja praticamente renegada. É claro que os perigos e natureza extrema da missão de Diana são constantemente trazidos à tona pela narrativa, principalmente por meio de diálogos. Todavia, os conflitos enfrentados pela nadadora não evoluem muito além do que é verbalizado como adversidade, ou breves cenas onde ela e sua equipe tem de contornar situações complicadas. Sabemos a todo momento que o que Diana enfrenta é absurdamente intenso, nós apenas não vemos muito disso.
Nyad é tecnicamente simples, mantendo-se sempre no básico e seguro. Nunca provoca nem experimenta nada, portanto, desaponta. Penso no potencial deste enredo, quando me lembro de outro filme baseado em uma história real, desta vez sobre mergulhos de resgate: Thirteen Lives, de 2022. O filme de Ron Howard é atmosférico e claustrofóbico, permitindo-se asfixiar, sem piedade, seu público. Thirteen Lives não tenta, em momento algum, ser confortável. O filme entende o quão extrema é a situação de suas personagens, e tenta nos transmitir isso da maneira mais autêntica o possível. Já Nyad, não. A obra da vez se contenta com pouco, e faz o mínimo de esforço para nos contar sua história.
Pelo menos, o filme acerta em abordar alguns transtornos psicológicos de Diana, principalmente relacionados ao relacionamento com seu pai, e a alguns traumas de sua infância. A abordagem utilizada para apresentar as fragilidades de Diana é interessante, baseando-se em breves e invasivos flashes do passado, que a atormentam incessantemente. É genuína a tradução do desconforto que memórias dolorosas e indesejadas podem causar ao insistir em visitar nossa mente constantemente, e funciona perfeitamente para nos dar contexto, sem cansar com obviedade e exposição textual exagerada.
Entretanto, apesar desta carga dramática, Nyad é mesmo um filme leve. O potencial de intensidade é desperdiçado, mas, ainda assim, entretém, e conta uma história interessante, conduzida por personagens carismáticas, envolvidas em relações orgânicas que ajudam a engajar na narrativa, e fazem do filme uma pouco inspirada, porém boa experiência.