Prey não é apenas “mais um” filme da série Predator. Nunca quis ser. A série que é composta por altos e baixos, nem consegue que os altos e os baixos sejam consensuais (eu, pessoalmente, divirto-me com quase todos eles, mas pouco há acima da média). Arriscaria dizer que nem mesmo o original, que é liderado no grande ecrã por Arnold Schwarzenegger, um filme divertido, tenso e cheio de ação, mas também com vários defeitos, incluindo uma abusiva utilização do ponto de vista (POV) da própria criatura.
Para liderar este projeto que nem sequer viu as salas de cinema – uma opção de marketing da Hulu/Disney para a promoção dos serviços de streaming e, felizmente, nada indicadora da qualidade da obra – o escolhido foi Dan Trachtenberg, um realizador de quem não temos visto muito, o que é de estranhar dado que o seu 10 Cloverfield Lane é um inteligente e tenso thriller. Talvez esse tenha sido o motivo para a sua escolha. Afinal esse filme faz com a saga iniciada por Cloverfield, algo que Prey também faz aqui, trazendo ideias novas, ar fresco e até uma certa radicalidade na sua mudança de foco e de género.
Prey é um filme passado há 300 anos. Uma prequela. A chegada do primeiro Predador. Um filme que nos conta a história dos nativos de terras que muitos já se esqueceram a quem pertenceram. Fala-nos da tribo Comanche, mas não só nos fala como os coloca no centro das ações, dando uma enorme representatividade a atores nativos e dando-nos uma história bastante original e interessante acerca de defesa territorial, que tanto pode ser contra um grupo de franceses estrangeiros como…contra uma poderosa máquina de guerra alienígena com tecnologia muito diferente e muito mais avançada do que a nossa (até do que a nossa atual, imaginem em comparação com há de séculos atrás!).
Talvez por ser um filme tão diferente das prévias entradas na saga, os primeiros minutos de Prey são estranhos. Estamos a apalpar terreno. Rapidamente se percebe que isto será muito mais um thriller de sobrevivência (ainda numa medida maior do que anteriormente na saga), de honra familiar e de defesa territorial, apostando menos nas componentes de ficção científica. Não começa com o Predador como foco, começa com estas pessoas e as suas histórias, embora se perceba desde a cena inicial que Naru – a personagem principal interpretada por Amber Midthunder – está certa acerca das suas suspeições de que os ataques selváticos cada vez mais perto da tribo se devem a algo mais do que a um grande urso. A prestação de Amber Midthunder como Naru é, aliás, um dos pontos fortes do filme, carregando esta história com todo o seu carisma, crença e força, tendo argumentos físicos e treino para grandes batalhas, mas, acima de tudo, mostrando utilizar mais o seu cérebro do que os outros guerreiros que preferem a força bruta.
As cenas de ataque do Predador são outro grande destaque, com sequências de ação claras onde tudo acontece bastante rápido mas onde também tudo se percebe e vislumbra, com direito a várias cenas sangrentas e violentas que irão fazer as delícias de quem isso procura. Desta vez, penso que se utilizou na dose certa a criatura, tendo direito ao seu razoável tempo no ecrã, mas focando a história bastante naquelas personagens e na sua luta cega contra um adversário invisível.
Ainda que não seja um filme perfeito – senti dificuldades em perceber o que queria ser nos primeiros 15 minutos; os animais em CGI nem sempre parecem o mais realista possível… – a 5ª entrada na saga tem o mérito de nunca tentar copiar os seus antecessores, trazendo algo novo que resulta, fazendo ainda várias homenagens ao que para trás (ou para a frente, cronologicamente…) ficou. É uma história contida, não é uma história que envolva o “fim do mundo”, mas é uma história sincera e interessante de ser contada. E que saudades que tenho deste tipo de histórias que não querem ser maiores do que o mundo!
Prey é exatamente aquilo que uma prequela deve ser: algo original que nos mostra as personagens conhecidas num contexto totalmente diferente. A forma tensa como esta história é contada até poderia resultar sem a presença do Predador, mas as suas cenas elevam a fasquia. Amber Midthunder tem uma atuação irrepreensível, fazendo de Naru uma das melhores personagens da saga. A saga está oficialmente de volta e para ficar.