O filme escolhido para a sessão oficial de encerramento desta edição do MOTELX, Resurrection, será tudo menos um filme fácil ou consensual. Ao contrário da escolha de abertura – Bodies, Bodies, Bodies – é bom que não esperem cenas cómicas e muitos risos.
O filme fala-nos de uma mãe solteira que está à beira de deixar a sua filha voar. Quase a completar os seus 18 anos, a jovem prepara-se para ir estudar para longe – não tão longe, cerca de 2h separarão as duas – e a mãe teme essa mudança. Ao mesmo tempo a sua vida amorosa parece tudo menos estável e a nível profissional passa por momentos stressantes. Mas isso não é o pior: no que parece um acaso, esta reconhece alguém do seu passado com quem partilha memórias muito marcantes que preferia esquecer. Mas será que esse sujeito está ali por acaso? Não parece…
Tudo isto acaba por afetar a nossa personagem principal, Margaret que é brilhantemente interpretada por Rebecca Hall, em mais um papel onde é demonstrado que filmes do género deveriam receber maior atenção por parte das premiações, especialmente no que diz respeito ao trabalho de atores. Nos seus olhos vemos o mundo a desabar, os pés a falharem-lhe e a sua racionalidade a ser seriamente posta em causa. É de trauma que voltamos a falar – um tema muito em voga nesta edição do MOTELX. O que certos acontecimentos, o que certos períodos da nossa vida nos fazem não se limitam a ficar contidos no tempo e no espaço. Serão sempre parte de nós…a não ser que arranjemos uma forma de os confrontar e derrotar.
Ressurection, pelas mãos de Andrew Semans, acaba por criar momentos de tensão acima da média e o seu primeiro ato deixa-nos completamente agarrados à cadeira a tentar perceber tudo o que ali se passa e como é que isto pode acabar. O segundo ato falha em manter esse interesse. A certa altura, abusa do fator repetição e percebemos que a escalada de perda de racionalidade da nossa protagonista principal parece não ter retorno e a única coisa pela qual aguardamos é pelo final, pelo confronto final com o que ficou no passado…ou melhor, deveria ter ficado, mas a própria não sabe sequer o que se passado foi e o que trouxe até ao seu presente.
O ato final é um daqueles que deixa muitas interpretações em aberto. Pessoalmente, escolho não o interpretar de forma literal até porque há várias pistas que o indicam (o olhar, a luminosidade), mas entrega tudo o se possa esperar de um body horror. Algo que este filme não é até…o ser. Percebo onde quer chegar e percebo o que nos quer dizer não só acerca de trauma, mas também de manipulação, de “deixar ir” ou de lutarmos contra os nossos demónios interiores e contra quem nos faz mal (o termo “pessoas tóxicas” não está na moda por acaso). Não entendo que a sua execução seja a mais eficiente e satisfatória, apesar da excelente atmosfera claustrofóbica criada e da impactante cena final.
Resurrection quer dizer muito sobre trauma e toxicidade, embora nem sempre seja claro em como ultrapassar essas situações. Rebecca Hall tem mais uma grande interpretação e carrega o filme às suas costas. A execução não atinge todo o potencial com um 2º ato repetitivo, mas o controverso ato final salva a obra.