Revisualizando: O impacto de Titanic

Titanic. Tinha eu sete anos. Uma idade tenra, certamente, mas mais do que suficiente para entender à época que o impacto daquele filme não era algo natural. Na escola – estava eu no 2º ano! – falava-se de Titanic. Em casa falava-se de Titanic. A imprensa também de outra coisa não falava e – sem surpresas – a primeira edição dos Óscares da qual tenho memória é a da vitória arrasadora do filme – 11 Óscares ganhos! – e do famoso grito de Jack Dawson recriado por James Cameron naquela noite: “I’m the king of the world!”. Esta foi – e provavelmente será para sempre – a edição mais vista de sempre da história dos prémios da Academia.

A célebre celebração de Cameron ao Óscar de Melhor Realizador será um pouco cringe, dirão alguns. Tal como poderá ser parte do romance mostrado, especialmente, na primeira hora do filme. Tudo isso faz, no entanto, parte da fórmula vencedora. Numa história que muitos transformariam num filme de desastre puro e duro, James Cameron entendeu que faria sentido colocar um romance proibido vivido entre personagens ficcionais. Sim, Jack e Rose não são personagens reais, elas não estiveram a bordo do Titanic. E, por muito que esse romance às vezes pareça demasiado “de cinema”, há cenas do mesmo que resultam brilhantemente, como a última cena entre ambos antes do desastre acontecer, quando Jack pinta o quadro de Rose e o olhar de ambos tudo diz. Este romance levou muitas adolescentes às salas de cinema, a repetirem a dose nos dias seguintes e para isso muito terá contribuído o carisma e a jovial beleza de Leonardo DiCaprio e Kate Winslet, duas escolhas de casting impecáveis que impulsionaram brilhantes carreiras, apesar de também significar a primeira de várias vezes que a Academia ignorou DiCaprio, não tendo direito sequer a uma nomeação, honra que foi justamente atribuída à sua co-protagonista.

Embora a introdução a este lendário navio seja necessária – mais não seja porque faz uma interessante crítica à sociedade e classes mais ricas, que hoje parece mais atual do que nunca – e ainda que o romance seja fundamentalmente bem concebido, é na segunda metade que Titanic atinge o patamar da imortalidade. Ainda hoje se percebe porque é que este foi, à época, o filme mais caro da história. Tudo aqui é grandioso. Os efeitos visuais continuam a impressionar, a escala do navio e os extras utilizados idem e o mesmo se pode dizer do guarda-roupa e da edição, faltando-nos tocar na poderosa e épica banda-sonora de James Horner. A canção original, cantada por Celine Dion, é daquelas que reconhecemos só de ouvir os acordes iniciais. E tudo isso explica o sucesso de Titanic.

Voltamos àquela segunda metade? Tensão, medo, sofrimento, paixão, compaixão, amor, luta, desespero, sobrevivência, aceitação. É incrível o que James Cameron consegue encapsular no que deveria ser apenas o caos e desespero próprios de um desastre natural. Trágico, sim, mas a incorporação de todos os elementos ligados à história de amor entre as duas personagens torna essas imagens e esses momentos ainda mais impactantes e dramáticos. Por mais que haja quem diga que tudo isto não passa de um romance à moda antiga com apelo apenas para o público feminino, estudos apontam que é um dos filmes que mais faz os homens chorar e tem ratings de apelo a homens maiores de 18 anos semelhantes a filmes como Iron Man, provando que é um público para todos os públicos que sabe tocar nos botões certos. Temos até direito a um dos mais desprezáveis vilões da história do cinema moderno – o arrogante Caledon Hockley, interpreado por Billy Zane – numa trama que muitos entendidos em escrita, certamente, diriam nem fazer sentido existir. Afinal, a catástrofe maior é outra. Mas Cameron queria também falar da condição humana e como muito é revelado de nós próprios, quer na forma como lidamos com pessoas de outros meio, quer no que fazemos por amor ou por dinheiro, quer como nos comportamos na hora de maior aperto.

Tal como em grande parte das maiores histórias de sucesso, de Titanic esperou-se o fracasso. O orçamento resvalou muito, tendo ultrapassado os 200 milhões de dólares norte-americanos. O próprio James Cameron admitiu que nos seis meses anteriores ao lançamento todos os elementos na sua equipa tinham consciência de que o filme iria fazer o estúdio perder, pelo menos, metade do que gastou ao fazê-lo. Cameron até se ofereceu para abdicar de eventuais lucros de bilheteira para atenuar os prejuízos, mas o estúdio (Fox) rejeitou por pensar que era uma proposta vazia, uma vez que previam que o filme não desse lucro. No final da sua campanha de exibição chegou aos 1.84 mil milhões de dólares. Depois de relançamento, vai hoje em 2.20 mil milhões de dólares e aproxima-se um novo relançamento em 3D.

Diz-se a palavra “Titanic” e o filme vem-nos imediatamente à cabeça. Jack e Rose. A famosa canção de Céline Dion. O incrível design de produção. Nada explica melhor o impacto de um filme que ficará para sempre na história do cinema.

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