Sylvester Stallone e Wesley Snipes são os protagonistas desta trama de acção, mas figurantes de algo muito mais substancial e importante que não sabiam estar a fazer parte.
Demolition Man tem tantas camadas que todo o fã de cinema pode ter onde se agarrar.
Explosões? Sim.
Humor mau de blockbuster? Sem dúvida.
Química forte de elenco igualmente forte? Confere.
Mundo distópico? Check. Mundo utópico? Sim senhor!
Confusão entre qual é qual e qual é preferível? Excelente tema de café em pré-época de futebol.
Reflexão sobre liberdade, nuances, vantagens e desvantagens e como liberdade choca com ordem e sociedade? Está lá!
Complexo messiânico disfarçado de símbolo de harmonia? Brindemos com um Cocteau.
Demolition Man é perfeito mesmo com as suas imperfeições.
Stallone contracena com Snipes que é uma coisa parva. Não precisa fazer mais do que o filme o encarrega a fazer. Daí a sua imagem rude, bruta e motivada por forte arco de personagem que não precisa de muito para empatizar. Tem lá a massa muscular para as sequências mais físicas e pimba. Se luvas fossem pessoas, calçaria Stallone em qualquer das mãos por qualquer estação do ano para qualquer utilidade. Snipes diverte-se e torna-se maior que todo o filme por cada vez que aparece. Tem um carisma núbio inigualável e ser o declarado espampanante extravagante vilão deu-lhe o transparecido gozo de interpretar. Até o gatuno do Denis Leary tem um papel forte, com arco forte, estabelecido com meia-dúzia de informações e confirmado ou desmentido conforme o enredo se desenvolve com ele. Sandra Bullock é a anti-sex symbol perfeita para a sua personagem, para este filme, para cyber-sexo e para “abimbalhar”.
Demolition Man só pode ser debatido depois de visto. É quase que injusto que eu tente vender este filme, como blockbuster que é, quando já se vendeu tanto quanto devia em 1993 e como a minha presença de espírito e faculdades cognitivas compraram e renovam renda sempre que se me surgem temas actuais como regras de convívio, tolerância, cultura e costumes, movimentos cívicos, crises geopolíticas ou até questões do foro introspectivo individual ou colectivo. Sim: Demolition Man faz-me pensar em sociologia. Tem lá disto para explorar se eu quiser vê-lo também com estes óculos.
…E é um filme típico de acção da década de 90: tem ritmo, tem estrutura, tem imensurável caos a espaços e tem EFEITOS PRÁTICOS.
Este depósito de pensamentos é uma carta de amor, é uma homenagem, é um solene obrigado, é um atestado de insuficiência a quem se recusar, não gostar, não tenha gostado, não tenha entendido, é uma indefensável defesa de um elevadíssimo filme rasteiro de índice artístico que me saberá para sempre ao melhor hambúrguer de rato que nunca comerei.