O ano é 2007. O realizador é Marcos Jorge. O estômago está preparado para a viagem.
Nonato é um teso com um talento inato para cozinhar. Nonato é limitado no departamento intelectual com um calcanhar ou fígado de Aquiles.
Nonato tem a sua história contada em duas perspectivas: a sua vida antes da prisão e a sua vida no encarceramento.
Este romance com toques de misticismo implícito e narrativa “larger-than-life” assenta perfeitamente com a personalidade humilde, simples e ingénua de Nonato.
Até fazermos sentido de toda a história, deliciamo-nos de como é que Nonato se vai safar desta ou daquela peripécia. Como é que Nonato consegue? Como é que Nonato sabe? Como é que Nonato encanta e enternece ao mesmo tempo que nos enternecemos e encantamos de como o mundo cru e implacável tenta atingir Nonato vezes sem conta, para somente esbarrar na sua simplicidade inabalável por não saber o que se passa com o que lhe tentam fazer ou por estar protegido por uma pureza que simplesmente já não existe entre adultos.
Tanto o seu arco em liberdade como na prisão têm alto valor de entretenimento, com peripécias a ocorrer e a ser ultrapassadas com estranha sagacidade, pura sorte ou sucessões de acontecimentos em cadeia para um desfecho favorável ao protagonista.
A filmografia e banda sonora não são nada de inovador nem revolucionário. São o suficiente. Satisfazem e não ofuscam. Aqui a estrela é Nonato. Não é Bujiú, Zulmiro ou Giovanni. Não é Íria. Todos aproveitam Nonato. Todos se aproveitam de Nonato. Todos se encantam por Nonato, para tentar canalizar esse encanto a seu favor. Todos tiram partido de Nonato.
A grande moral da história de “Estômago – Uma história nada infantil sobre poder, sexo e gastronomia” é de que o poder corrompe até o mais estóico dos seres, o sexo subverte os princípios do até mais puro dos seres e a gastronomia é o grande apaziguador do até mais inquieto dos seres.