Quando uma nova sequela de Saw foi anunciada, muitos franziram as sobrancelhas. A mesma foi anunciada como um projeto de Chris Rock para revitalizar a saga, onde o mesmo atuaria e ajudaria a polir o guião. Não se pode dizer que essas primeiras informações tenham sido muito animadoras. Este seria já o 9º filme da saga (demasiados, tendo em conta que o primeiro tem apenas 16 anos), o nome de Chris Rock era dificil de associar ao terror e chavões como “revitalizar a saga” é algo a que já estamos habituados a ouvir no mundo de terror, sem que, necessariamente, se traduza em algo mais do que “tentar fazer mais dinheiro com esta marca”. Foi assim que chegamos a Spiral: From the Book of Saw.
Na realização voltamos a ter Darren Lynn Bousman (conhecido por Saw II, Saw III e Saw IV), que – apesar de eu ainda não ser o maior fã da sua utilização das cores e elementos de saturação no ecrã – realizou alguma das melhores sequelas da série, o que transmitia uma certa confiança. Chris Rock ficou com o papel principal, como Detective Zeke Banks, um polícia (filho de polícia, interpretado por Samuel L. Jackson ) odiado por quase todo o departamento onde trabalha, por ter ajudado a desmascarar um polícia corrupto. Na história, vários elementos das forças policiais começam a aparecer mortos, de forma macabra e violenta, sendo que o assassino parece ter alguma ligação pessoal com a personagem de Rock.
Isto é um Saw muito diferente do habitual. O sangue está cá, o gore também, tripas de fora não faltam, portanto não pensem que vão para uma sessão de A Bela Adormecida. No entanto, tudo isto é-nos mostrado por uma outra perspetiva na grande maioria da sua duração. É-nos mostrado pelo lado da investigação, criando um clima bem mais parecido com o de um thriller policial à lá Se7en do que um clima semelhante às sequelas de Saw, que muitas vezes se limitavam a armadilha atrás de armadilha, com muito pouco plot a juntar as peças. O facto de vermos quase tudo através da perspetiva do detective Zeke permite-nos chegar às mesmas conclusões que ele, em tempo real, permite-nos ter as nossas suspeiçoes e esquematizar o nosso raciocionio lógico.
Claro que isto retira algum tempo de exposição às vítimas e às suas tentativas de se verem livres das armadilhas, que, em capítulos passados, poderiam demorar uma eternidade. Aqui esses momentos são mais rápidos, sendo que o maior foco está no mistério. Há também, como seria de esperar, mais elementos cómicos, usualmente introduzidos por falas da personagem de Chris Rock (este começa o filme a fazer-nos questionar, de forma cómica, se Forrest Gump seria um filme politicamente correto para os tempos atuais). No entanto, estes momentos decorrem de uma forma fluída, não retirando a tensão ao filme e não permitindo que descambe para uma paródia de Saw. Aqui devo também dizer que o próprio Chris Rock me surpreendeu, com uma prestação que, não sendo nada do outro mundo, é segura e equilibrada, provando que se pode dar bem noutro tipo de papéis.
Ainda assim, vou-vos confessar: eu vi o plot twist a chegar a milhas de distância! Talvez sou eu que vejo filmes a mais, talvez haja pouco que me surpreenda e que perceba quando alguns elementos nos são (ou não) apresentados em cena. Ainda assim, a forma como lá se chega é interessante e racional. Continuo também a ter alguns problemas com a palete de cores e tonalidades escolhidas pelo realizador. No entanto, este talvez tenha sido o filme onde o mesmo se esforça mais por parecer “natural”, com a maioria dos elementos – como quando a ação se passa na esquadra ou nas ruas – a esquecerem a sua habitual tonalidade verde, apresentando um aspeto mais crú e mais cinzento.
Posto isto, acho que o balanço entre violência crua e nua e trabalho de investigação policial resulta bastante bem e esta parece-me ser uma das mais consistentes sequelas de Saw (a melhor continuação?). Ainda que não seja um filme perfeito, Spiral é um bom e coerente thriller policial que não esconde pertencer ao universo Saw, com direito a armadilhas arrepiantes e gore com fartura. Este parece, mesmo, ser o caminho certo para a saga.