Mônica e sua turma são um tesouro nacional brasileiro. Há mais de sessenta anos, as personagens criadas por Maurício de Sousa encantam as crianças e as introduzem para o universo da leitura.
Ao longo dos anos, a turminha já se aventurou por diversos meios diferentes, no intuito de expandir seu público e, é claro, estender a longevidade de sua marca. Além dos gibis, tivemos séries e filmes animados para a tv, peças de teatro, parques temáticos e até uma série de quadrinhos da versão jovem da turma, inspirada nos mangás japoneses.
Então, em 2012, a Maurício de Sousa Produções deu início ao seu projeto mais relevante desde as séries animadas: a coleção Graphic MSP. Esse selo consiste em graphic novels escritas e ilustradas por diferentes artistas brasileiros, que usam diferentes abordagens narrativas e visuais para apresentar suas visões únicas sobre as personagens e o universo criados por Maurício.
A iniciativa deu muito certo, conquistando tanto a crítica como o público. Foram vários os sucessos originados do selo, mas, entre tantos títulos aclamados, um se sobressai: Turma da Mônica: Laços, escrito e ilustrado pelos irmãos Vitor e Lu Cafaggi. Com um tom sensível e emocionante, a HQ acompanha Mônica e seus amigos em uma perigosa aventura à procura do cãozinho perdido do Cebolinha, Floquinho.
O frisson de Laços foi tanto, que garantiu mais duas sequências: Lições e Lembranças, fechando assim a celebrada trilogia Cafaggi. Mas é claro que esse case de sucesso não podia parar por aí. Era hora de expandir ainda mais os horizontes da Turma da Mônica e se aventurar pelo universo das adaptações cinematográficas em live-action, e Laços era a escolha perfeita para o projeto.
Com Thiago Dottori no argumento e Daniel Rezende na realização, foi lançada, em 2019, a versão para os cinemas da graphic novel. Rezende e Dottori tinham aqui a missão de não só fazer jus ao material base, mas a todo um legado de anos e anos de história. E, por mais que o resultado não seja excepcional, cumprem o desafio com êxito.
O material base de Laços não é extenso o suficiente para sustentar a narrativa de um longa-metragem, então já eram esperadas mudanças no roteiro, como subtramas extras e extensões das já existentes. O que não se esperava, entretanto, era a mudança no tom da trama.
Um dos elementos mais elogiados da HQ dos irmãos Cafaggi é o tom melancólico escolhido para a história. A jornada dos quatro amigos, Mônica, Magali, Cebolinha e Cascão é envolta de uma constante sensação de perigo, medo e tristeza. Já na versão cinematográfica, Laços conta com um tom mais leve e infantil. Essa mudança pode ser sentida em todos os aspectos do filme, mas o que mais se destaca é a paleta de cores escolhida.
Enquanto a HQ abusa de cores sóbrias e tons pastéis, o filme opta por cores vivas, alegres e quentes, aproximando-se mais do que encontramos nos tradicionais gibis da turminha. Durante o filme, há uma dominante sensação de que estamos assistindo a uma versão estendida de uma revistinha clássica da Mônica, enquanto a real essência do material base é deixada um pouco de lado. É ótimo ver sua infância, em toda sua essência, representada em carne e osso, mas é inevitável sentir-se frustrado com a ausência do que há de mais marcante no trabalho original dos Cafaggi.
Outro fator frustrante do longa é o pouco inspirado segundo ato. Depois de começar com um pé direito em uma introdução divertida de ritmo contagiante, o filme sofre de um desenvolvimento enrolado e cansativo. Os desafios enfrentados pela turminha em sua jornada são pouco empolgantes e sofrem para manter a atenção de quem assiste, e há um exagero de cenas introdutórias da grande ameaça do enredo. Talvez uma ou duas cenas do antagonista fossem o suficiente para amarrar bem a trama.
O que salva esse terço do filme é a ótima participação especial de Rodrigo Santoro como o Louco, e a emocionante cena da encruzilhada, que marca um importante momento de aprendizado das suas personagens principais. Provavelmente, o ponto alto do filme.
Tendo isso em vista, a conclusão tende a surpreender. Após o desenvolvimento morno, espera-se do ato final um embate breve com soluções genéricas, e o que se recebe é uma sequência de cenas inventivas e divertidas. Turma da Mônica: Laços não só volta a empolgar na reta final, como firma de uma vez por todas o elenco principal como o melhor elemento de todo o filme. Os quatro inseparáveis amigos do Bairro do Limoeiro são fielmente representados pelos seus intérpretes.
Laura Rauseo é perfeita como Magali, a comilona da turma. Laura traduz perfeitamente a fofura e irreverência da sempre carismática devoradora de melancias.
Gabriel Moreira vive bem o preocupado Cascão. O menino entrega no papel de companheiro que está sempre disposto a ajudar seus amigos, independentemente de seus medos e inseguranças.
Kevin Vechiatto é Cebolinha em sua mais pura travessura e sapecagem. Entre planos infalíveis e um ego impossível, Kevin convence com sua versão emocional do pequeno troca letras.
E Giulia Benites simplesmente nasceu para ser a líder do grupo, dona da rua e detentora do cobiçado coelho de pelúcia: Mônica! Muito além da aparência, Giulia encanta ao encarnar perfeitamente o temperamento explosivo da esquentadinha de vestido vermelho.
Está aí, a essência de tudo o que nos encantou quando pequenos e segue encantando crianças geração após geração. Por fim, esse cuidado e carinho pelo legado da obra de Maurício de Sousa acabam por compensar as questionáveis mudanças em relação ao tom da história original. É impossível ter crescido lendo os gibis da turminha e não terminar Turma da Mônica: Laços com um sorriso no rosto!
É lindo ver a Maurício de Sousa Produções investindo em suas personagens através de diferentes meios, insistindo sempre na excelência da qualidade do seu serviço! Nesse momento, Laços já recebeu uma sequência (que logo receberá uma review aqui no site) e confirmou a conclusão de sua trilogia, além de garantir uma série original produzida pela Globo Play, que conta com o mesmo elenco do longa e já tem sua produção em pleno vapor. Esse momento é muito empolgante para quem ama o universo da Mônica, e eu não podia estar mais empolgado para o que vem a seguir!