Revisualizando: The Last Naruto: The Movie traz conclusão digna para relacionamento mal desenvolvido

Mesmo grandes fãs de Naruto devem admitir que o anime não é perfeito. Repleto de fillers, tramas excessivamente prolongadas e personagens subdesenvolvidas, o fenômeno japonês derivado do Mangá de Masashi Kishimoto cansa até mesmo o público mais fanático.

Para acompanhar Naruto é necessário uma destas duas coisas: muita paciência, ou um guia detalhado de episódios a evitar de se assistir. Entretanto, apesar de ser exaustivo em certos momentos, o anime recompensa com seu universo complexo, cheio de conceitos originais empolgantes e personagens criativas.

The Last Naruto: The Movie é, como diz o título, o último filme a contar uma história protagonizada pelo ninja atrapalhado antes de ele passar o manto para seu filho. The Last é repleto de ação, mas é, principalmente, uma história de amor.

Sim, amor. The Last é uma obra que adora tudo o que Naruto é, mas reconhece alguns dos problemas da série e tenta não corrigi-los, mas, pelo menos, compensá-los com uma conclusão digna. E o principal desses problemas a ser abordado aqui é a relação entre Naruto e Hinata. Uma relação amorosa que teve um início promissor no impactante arco do vilão Pain, na série Naruto Shippuden, mas que foi praticamente abandonada no restante do programa.

Aqui, vamos fundo nos sentimentos do casal. Mas, apesar de o amor de Naruto para com Hinata não se apresentar da maneira mais natural ou convincente, o filme não aborda o tema com a superficialidade que eu, pessoalmente, esperava. Muito pelo contrário. The Last vê nessa simples premissa a oportunidade de explorar as mais internas ansiedades da dupla de protagonistas, e como isso interfere na relação que um leva com o outro.

Hinata é extremamente introvertida, e sofre com uma insegurança fortíssima. Sua dificuldade de se impor vai além do grande desafio de se declarar a Naruto, que a intimida com sua personalidade extrovertida. Sua baixa auto-estima é tão opressora, que a condiciona a uma constante e sufocante condição de submissão. Hinata se sente refém em qualquer situação, e indigna da atenção de qualquer um.

Naruto cresceu sozinho, abandonado e marginalizado por todos de sua aldeia. Com o tempo, conquistou o carinho e o respeito de seu povo, mas as marcas do abandono são feridas que jamais conseguirá curar. Apesar de sua extroversão e aparente facilidade de se relacionar com os outros, Naruto nem sempre sabe abordar as pessoas da maneira correta, e desliza muito quando se trata de Hinata

Independente de quantas pessoas estiverem à sua volta, ele sempre se sentirá solitário. Naruto ainda é estranho ao fato de ter alguém tão afeiçoado a ele, ao ponto de desejar passar a vida ao seu lado. Ele não é capaz de perceber o amor de Hinata por si só, pois não acredita nessa possibilidade.

E é no envolvimento entre essas duas personagens e o choque entre suas personalidades, que The Last encontra sua maior força. Naruto e Hinata finalmente demonstram ter química, ou sequer uma relação verdadeira de afeto. Uma pena o filme usar de artifícios tão exageradamente grandiosos para desenvolver sua trama.

Hanabi, a irmã mais nova de Hinata, é sequestrada. Então, liderados pelo estrategista Shikamaru, Naruto, Hinata, Sakura e Sai, saem em missão em busca da princesa Hyuga, com o objetivo adicional de investigar os sequestradores que podem estar ligados com a aproximação iminente da Lua, que ameaça se chocar contra a Terra.

A trama que carrega as personagens para a ação é interessante e, por mais que seja exagerada, é minimamente engajante. O problema é que o filme nem sequer tenta disfarçar que tudo se passa de um grande pano de fundo para o desenrolar do casal de protagonistas. A missão de resgate em si se resume a breves momentos de discussões e diálogos rápidos. Tudo muito superficial e apressado. The Last certamente ganharia mais caso fosse um filme menor, mais contido em ação e mais pessoal.

O que o argumento trabalha maioritariamente bem são as personagens secundárias. Apenas duas de maior importância são subutilizadas. São elas Sasuke, que aqui surge simplesmente para ser incrível por uma fração ridícula de segundos e desaparecer novamente, e Shikamaru, que não demonstra nada de sua genialidade e carisma.

Quanto aos bem trabalhados, temos os kages, líderes militares dos cinco grandes países do universo de Naruto, que, em poucas linhas de diálogos e rápidas cenas de ação, demonstram muita personalidade e fidelidade ao que demonstraram ser no anime. Temos também Sai e Sakura. O primeiro faz muito e fala pouco, mas quando fala, faz valer a pena. Sai não sabe entender as pessoas e muito menos o que sente, e sua confusão e estudos para o fazerem melhorar nesse aspecto fazem dele um ótimo alívio cômico. Quanto à Sakura, que alívio vê-la sendo bem utilizada. Kishimoto nunca soube desenvolvê-la corretamente, negando-a a arcos dramáticos realmente interessantes e cenas de ação dignas de seu potencial. Aqui, Sakura não só é muito ativa e importante para a missão, como é o principal catalisador para quebrar as barreiras erguidas entre Naruto e Hinata.

Mas, infelizmente, The Last ainda traz dois grandes problemas recorrentes no anime para si. O primeiro deles é a superexposição. Quem gosta de Naruto está acostumado com a pouca subjetividade do seu texto, e a exposição não chega a estragar a experiência como um todo. Entretanto, seria muito mais agradável se as personagens não verbalizassem tanto o que pensam ou sentem. O outro problema é o excessivo uso de flashbacks repetidos. Vemos algumas cenas, pelo menos, mais de duas vezes. Valorizo a ideia de esconder detalhes das cenas nas primeiras vezes em que são mostradas, para só revelar por completo mais à frente. Porém, esse recurso narrativo poderia facilmente ser abordado de maneira mais dinâmica e menos cansativa do que é apresentado no produto final.

Entretanto, há artifícios narrativos e técnicos que funcionam perfeitamente bem em The Last. Nos momentos em que Naruto e Hinata começam a desenvolver sua relação e criar laços mais fortes entre si, tudo flui muito bem, técnica e ritmicamente. Enquanto estímulos visuais nos apresentam esses laços sendo formados fisicamente, diálogos em off entre os dois geram uma calorosa sensação de intimidade e confidencialidade, que só demonstra mais ainda o quanto o filme clamava por menos exageros, e mais calmaria.

The Last Naruto: The Movie é um reparo em relações que pediam por mais e, ao mesmo tempo, um filme que podia muito bem ser menos. Ver Naruto destruindo tudo com seu poder exorbitante é sempre bom, mas respiros são necessários, e aqui fazem falta. Mas, felizmente, o que mais importa é abordado com o respeito e carinho que merece, e nós, o público apaixonado por Naruto e todo o seu universo, saímos ganhando com emoção e nostalgia.

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