The Exorcist: Believer não irá criar novos crentes

David Gordon Green chega à saga The Exorcist, depois de três filmes de Halloween. A mais recente trilogia de Michael Myers deixou-me com sentimentos mistos. Se gostei muito do primeiro filme, também me diverti com Halloween Kills mais do que a maioria da crítica (embora apresentando já um guião bem mais fraco), mas não gostei nem um pouco do fecho da trilogia com Halloween Ends. Diria que o que safou Gordon Green é que esta “requela” de The Exorcist já estava em produção e o mesmo já a estava a filmar. Confesso que nunca adorei a ideia por aí além, principalmente pelo peso da responsabilidade de tocar num dos maiores clássicos do cinema e por ser um subgénero – o de exorcismos – saturado e com poucas ideias novas a aparecerem nos últimos anos. 

Nesta história, duas raparigas desaparecem na floresta e apenas regressam três dias depois. Depois da euforia da chegada, rapidamente as suas famílias se apercebem que algo de errado se passa com Angela (Lidya Jewett) e Katherine (Olivia O’Neill). O pai de uma das jovens decide então procurar Chris MacNeil (Ellen Burstyn) que nunca irá perder as marcas do que passou para salvar a sua filha de uma posessão há várias décadas atrás. A premissa do filme é interessante. Aliás, é no primeiro ato que o filme mais acerta. Tem uma boa cena de abertura e leva o seu tempo a mostrar-nos quem são as suas personagens principais, ainda antes de algo de errado acontecer, uma opção igual à do filme original de 1973. Quando as jovens regressam e começam a demonstrar estranhos comportamentos, também temos direito a algumas boas e tensas cenas, sendo praticamente as únicas da obra que são capazes de criar uma atmosfera pesada e inquietante. Há uma cena particularmente eficaz e muito bem conseguida entre Angela e o seu pai Victor (Leslie Odom Jr.) na casa de banho da sua casa, culminando ainda bastante bem em outro acontecimento no dia seguinte. Também marcante é a cena de Katherine na igreja. O problema vem depois. 

 

Nunca é fácil trabalhar o “bolo” de uma obra. Se é verdade que muitas vezes temos o início e a conclusão na nossa cabeça, é no caminho para se lá chegar onde mais vezes nos perdemos. E isso parece ser o caso do guião deste The Exorcist: Believer a cargo de Scott Teems, Peter Sattler e do próprio David Gordon Green. A partir do momento em que as famílias e a comunidade onde residem se apercebem destes estranhos comportamentos, o guião tem muita dificuldade em desenvolver a história desse ponto até ao ato de exorcismo, que já sabemos que irá marcar o ato final. Da parte das meninas possuídas pouco mais é acrescentado, apesar de ambas terem atuações exemplares naquilo que lhes é dado. Do lado dos pais, continua a safar-se Leslie Odom Jr., que é o único que se apresenta sempre acima da média e o único adulto que traz maior multi-dimensionalidade à sua personagem.

Já do lado da maior experiência, Ann Dodd – como vizinha, enfermeira e antiga aspirante a freira – e Ellen Burstyn – com um regresso ao seu papel do filme original, embora a sua aparição aqui seja de pouco mais do que dez minutos – não conseguem mostrar o seu valor devido – outra vez – a um limitado guião que as obriga a séries sucessivas de diálogo expositivo, com diálogo pouco entusiasmante ou interessante, expondo os temas do filme de forma demasiado óbvia e embrulhando a trama para um ponto de não retorno. Aqui ou ali há algumas cenas boas e interessantes. Ou que, pelo menos, procuram surpreender, como é o caso do encontro entre o demónio e Chris. No entanto, é tudo tão espaçado entre os tais diálogos desinspirados que fica difícil que esses momentos tenham o impacto que deveriam ter. 

As coisas melhoram no final. O exorcismo, guardado para o ato final (pois, claro!), está longe de começar de forma perfeita, pois na nossa cabeça ainda está a forma atabalhoada como o mesmo foi construído, mas há uma carta na manga interessante que é trazida – acerca de escolhas – que não é algo muito visto antes no género. Não é uma má conclusão. Chega a surpreender e a chocar, mas não chega para retirar o gosto amargo de mais de 50 minutos onde o filme andou totalmente à deriva. 

Tecnicamente, podem esperar bons efeitos especiais – claro -, um excelente trabalho de maquilhagem e algumas interessantes escolhas de ângulo na filmagem a homenagear o filme original na forma como a câmara se afasta ou aproxima dos atores. Se a banda-sonora é bastante esquecível, já os efeitos sonoros estão a um excelente nível, com destaque para as situações onde os decibéis sobem de forma inesperada e estridente.

Com mais dois capítulos confirmados, será difícil que este Believer entusiasme a audiência para o que aí vem. Há, ainda assim, algumas bases interessantes que poderão ser aproveitadas para trazer um produto superior, caso exista um guião à altura. O regresso de The Exorcist não é péssimo como alguns afirmam, mas é, acima de tudo, desapontante. Nunca se poderia pedir que estivesse à altura do clássico, mas deveria estar à altura da forte fornada de cinema de terror que temos tido recentemente. O primeiro ato é bom e os minutos finais até trazem algumas surpresas interessantes. O problema está na forma caótica e pouco convincente como até lá chegou. E isso é a maioria do tempo do filme. 


The Exorcist: Believer
O Exorcista: Crente

ANO: 2023

PAÍS: EUA

DURAÇÃO: 111 minutos

REALIZAÇÃO: David Gordon Green

ELENCO: Leslie Odom Jr.; Ann Dowd; Jennifer Nettles; Norbert Leo Butz; Lidya Jewett; Olivia O'Neill; Ellen Burstyn

+INFO: IMDb

The Exorcist: Believer

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