A complexidade de The Humans

Objetivos, expectativas, projeções. Vivemos de anseios tão expansivos e complexos que não damos conta de vencê-los nós mesmos. A carga é pesada demais para qualquer um aguentar por si só, o que naturalmente resulta no compartilhamento desse fardo. Aos nossos amados e entes queridos, doamos a tarefa de cumprir nossos desafios não finalizados e atingir nossas perspectivas não consensualmente impostas a eles. É injusto e pode ser, muitas vezes, doloroso, mas não podemos evitar.

The Humans é um lindo retrato disso, e acerta ao conduzir sua trama com sutileza e o uso da não-verbalidade emocional.

É costumeiro que tenhamos nas nossas famílias uma base de confiança e afeto que nos sirva de alicerce. Entretanto, mesmo nos melhores cenários, não escapamos da enorme e inevitável pressão causada pelo convívio familiar. Stephen Karam (argumentista, realizador) entende muito bem essa questão e traduz a temática numa unidade exemplar de texto e forma, fazendo do longa uma incrível experiência audiovisual.

Lol Crawley (diretor de fotografia) compõe seus quadros de modo que transmita o estado emocional das personagens imageticamente. É comum se deparar com reenquadramentos em cena, às vezes mais de um em um único take. Todos parecem enclausurados, de certa forma. O ambiente oprime as personagens e, em sua composição, passa a sensação de que, apesar de parecerem confortáveis com a companhia uns dos outros, há uma moldura invisível que os impede de ser, ou existir, livremente.

A câmera tende a se manter imóvel em boa parte do filme, movimentando-se apenas em momentos de crescente tensão ou para acompanhar a movimentação das personagens, quando seu deslocamento pelo cenário se faz essencial para o decorrer da narrativa. A comunicação entre o elenco e a fotografia é muito natural, dado o esforço dos atores, que apresentam um belíssimo trabalho. Todos estão fantásticos em seus papéis, mas Richard Jenkins (Erik) se destaca com uma atuação tão verdadeira, que parece não estar representando. Assisti-lo em cena é inacreditavelmente satisfatório.

The Humans é complexo em todas suas camadas, apesar da temática simples. Um ótimo exemplo de que pouco pode ser muito, e que o não mostrar ou o não dizer, podem ser tão ou mais potentes quanto os seus opostos. Karam nos contempla com um drama e nos atiça com sutís momentos cômicos, porém, o mais surpreendente, é a inserção de elementos de terror no filme. É interessante perceber como o gênero estava sempre lá, escondido, dando dicas de sua presença, só esperando pelo momento certo de deixar a timidez de lado e dar a cara à tapa. O produto dessa ousadia é uma sequência brilhantemente agonizante e, também, muito relacionável. O longa mostra que nossas frustrações e ansiedades podem-nos levar ao limite do desespero, a perder o controle e a nos entregarmos completamente ao pavor irracional.

The Humans finge ser uma obra pequena, mas demonstra, afinal, ser grandiosa. Com delicadeza e verdade, acerta ao entender bem suas personagens e respeitá-las com um texto que apresenta suas falhas sem julgamentos, seus méritos sem exagero, e mantém suas particularidades em segundo plano, deixando a nosso cargo a missão de desvendá-las, ou não.


The Humans

ANO: 2021

PAÍS: EUA

DURAÇÃO: 108 minutos

REALIZAÇÃO: Stephen Karam

ELENCO: Richard Jenkins; Jayne Houdyshell; Amy Schumer; Beanie Feldstein; Steven Yeun; June Squibb

+INFO: IMDb

The Humans

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