Tem sido uma semana curiosa para mim: tem-me dado os filmes que mais aprecio e os que menos aprecio do ano, havendo pouco espaço para o meio termo. The Medium é um terror sobrenatural tailandês com realização de Banjong Pisanthanaku, que um dia realizou o excelente Shutter e o também muito eficaz Alone, tendo também o auxílio na produção e na escrita do coreano Na Hong-Jin, conhecido pela escrita e realização de The Wailing e Chaser. Os nomes faziam antever que algo de bom poderia sair daqui e a temática que envolve família, religião, tradições e misticismo é algo que sempre me despertou a atenção.
A trama do filme gira à volta de Nim, uma medium venerada numa pequena comunidade no Nordeste da Tailândia, onde se acredita que ela herdou o espírito de Ba Yan, uma divindade local que ajuda a combater espíritos maus. Um historial de tragédia tem assolado a sua irmã Noi, que um dia se recusou a ser ela a herdeira do espírito de Ba Yan. À sua volta, várias pessoas próximas têm morrido e apenas resta ela e a sua filha Ming, que tem apresentado estranhos comportamentos. Ao início, pensa-se que Ming está a receber a presença de Ba Yan para que a divindade passe a possuí-la, mas Nim começa a desconfiar que o espírito que se manifesta em Ming talvez não seja o de uma entidade bondosa. Tudo isto é nos retratado através dos olhos de uma equipa de filmagens que se encontram na vila para documentar a vida da medium Nim, sendo este mais um filme que opta pela técnica de found footage.
Mais um, calma aí! Eu gosto de algumas obras do género, mas confesso ter sentimentos mistos em relação à técnica, que muitas vezes se torna irritante, com pouca razão de ter sido escolhida, dando-nos filmes muito parecidos entre si. Não é, felizmente, aqui o caso. O facto de ser uma equipa variada de filmagens permite-nos diferentes perspetivas, mas o filme também inova na utilização que faz dessas câmaras – ou até quando inclui câmaras fixas em divisões à lá Paranormal Activity –, fazendo também um excelento uso dos cenários abertos, verdes e de cortar a respiração desta região tailandesa. Acho que nunca disse que um filme do género possuía uma bela fotografia, mas aqui está este exemplar para me trazer algo novo (e não apenas porque utiliza belos cenários, mas porque sabe empregar cores e todos os elementos no ecrã em sintonia em demasiados momentos para ser obra do acaso).
A história é um dos grandes destaques deste filme e se estiverem preparados para esta viagem serão recompensados. O filme constrói-se de forma lenta – já vos disse que adoro slow burns? – mas não há um minuto que seja desperdiçado. Tudo tem uma razão de existir, tudo faz sentido e a tensão sobe. E sobe. E sobe. Sobe até quase se tornar sufocante e, sem darmos conta, estamos totalmente agarrados ao filme quando ele decide colocar mais uma mudança, primeiro com alguns sustos bastante eficazes (e eu que já pensava não cair em jumpscares!) e depois com 20 minutos finais absolutamente loucos. Mas a história só resulta porque toda a gente aqui presente parece também possuir poderes sobrenaturais na arte da representação.
Todos cumprem o que é pedido, mas Sawanee Utoomma como a Medium – com expressões que valem mil palavras e com um grande feeling de personagem terra-a-terra com quem facilmente nos identificamos – e Narilya Gulmongkolp no papel da possuída Ming estão assombrosas. Esta última – que teve um papel anterior na televisão, mas sendo esta a estreia no cinema! – consegue transformar totalmente o seu papel em segundos e fá-lo como uma credibilidade que até para quem está habituado a filmes de possessão, chega a impressionar. As cenas em que a mesma sorri de forma estranha trazem arrepios na espinha a qualquer um e eu, que já não sou muito de me assustar em filmes de terror, voltei a sentir o que é ficar com pele de galinha. Não acho que um filme de terror tenha que ser assustador para ser bom – há elementos que tornam um filme bom para além de reações primárias – mas esta obra consegue conjugar as duas vertentes.
The Medium é um filme que irá recompensar tudo o que vocês invistam nele. Com um forte foco em crenças e tradições, constrói, ao seu ritmo, uma história verdadeiramente aterradora, transmitindo uma áurea de realismo como há muito não via num filme de terror. É, provavelmente, o melhor found footage alguma vez feito e um dos melhores filmes de possessão da história.