Titane (ou o experimentalismo das peripécias de um ser horrível)

Vi Irreversible, encaixei. Vi La Haine, encaixei. Vi Oldboi, encaixei. Vi La Montaña Sagrada, encaixei. Vi Titane, conformei-me.

Há uma transpiração exuberante a pretensiosismo por todo o filme. Esforço em segmentos de cinema epopeicos que separam o espectador comum do comum dedicado, tratando este segundo como menor ainda assim. Provavelmente a sra. Julia Ducournau fez este filme para o seu círculo de Julias. Potencial evidência desta crença é a senhora estar também creditada como escritora e ter, aparentemente, contratado dois sujeitos que creditou como consultores de escrita.

Este filme não é para mim. Não gosto de ser levado ao colo narrativamente tanto quanto detesto deparar-me com nariz empinado filmado no conto de uma história.

– Ainda que tenha odiado que me tenha sentido reduzido a pessoínha medíocre que deve antes canalizar o seu QI com pontuação ao nível das temperaturas médias na Sibéria;
– Ainda que quisesse com muita força destilar ódio sobre esta subjacência que só a mim diz respeito;
– Ainda que, provavelmente, bata tecla com exposição de uma insegurança qualquer em não ser o gajo de cachimbo, chá japonês e festas ao gato Sphynx que raivosamente acho que teria de ser para me colocar ao nível de ver este filme…

…Tenho de me render à viagem mirabolante de compreensão e encaixe, directa, crua e desafiadora de Titane.

A nudez é à francesa mas proposital. Agathe Rousselle tem uma prestação magnífica no fim das contas e faz do corpo uma ferramenta de representação e não um mero atractivo detractor do filme (como pediria para ser feito um senhor Abdellatif Kechiche – passem-me o cachimbo!). Esta autêntica tresloucada fez-me sentir imenso sobre a sua personagem completamente descompensada e isso tem de ser positivo por obrigação. Representação que me faz sentir algo pela personagem e não pelo intérprete é indiscutivelmente algo positivo.

Vincent Lindon é igual e profundamente doente. Os seus traumas, pavores, manias e manifestações de tais são de um realismo aterrador que me liga novamente ao filme de onde até então era mero espectador a 300m de distância intelectual disto tudo. Há todo um compêndio de representação a escrever da sua prestação apenas, quando o filme não era sobre si e ele forçou-o a si quando o pendor do guião vertia para Alexia (Agathe).

Esta coisa está muito bem filmada. A qualidade dos planos e sequências está perfeitamente executada. A paleta de cores é arrojada e ousada. Perde-me a espaços mas eu, como membro reles da classe operária deverei rever o filme para poder apreciar todo o vislumbre tentado.

A banda-sonora encaixa-se bem nos momentos sem se destacar nem roubar para si o que a superioridade das outras esferas (imagem e história) deram por garantido, pesando a franca qualidade.

Observando Titane pelo que é e me fez sentir enquanto filme são processos diferentes. Separei-os para evitar deixar-me levar pelas emoções que me causou por forma a não culpar o filme como objecto mas pela viagem que o objecto me fez embarcar. Por isso, de ego ferido, Titane leva de mim 4 estrelas.


Titane
Titane

ANO: 2021

PAÍS: França, Bélgica

DURAÇÃO: 108 min.

REALIZAÇÃO: Julia Ducournau

ELENCO: Agathe Rousselle, Vincent Lindon

+INFO: IMDb

Titane

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