A premissa de Zalava, uma produção iraniana de baixo orçamento, é muito simples: um demónio assola uma vila, um exorcista vem para salvar a comunidade e, aparentemente, cumpre o objetivo, guardando o tal demónio numa jarra de vidro. Vemos o que está lá dentro. Ou não vemos? À partida parece que nada lá está. Mas será que alguém se arriscará a abri-la e potencialmente soltar o demónio que irá atacar aquela pequena aldeia? Se há alguém, esse alguém é o chefe da polícia local, Masoud Ahmadi, em vias de deixar o posto por ser detestado por todos na aldeia por em nada daquilo acreditar e por o verem como culpado de uma morte passada, permitindo, segundo os locais, o demónio fazer o seu trabalho. Mas até ele hesita…abrir ou não abrir?
Praticamente todo o filme anda à volta desta premissa que envolve crenças e superstições, sim, mas também medo. Afinal, o medo é a base de muitas dessas crenças. Temos medo do que não sabemos explicar e depois procuramos explicações para o nosso medo. A interpretação de Navid Pourfaraj como o chefe da polícia é muita da alma deste filme, uma vez que assim como ele, a maioria de nós não acredita; mas, assim como ele, a maioria de nós talvez não abrisse a tal jarra. Afinal, para quê arriscar? Zalava é um filme intenso, com uma atmosfera sombria, uma fotografia escura bem adequada ao tema e um aspecto que em nada parece o de uma produção de tão baixo orçamento. Tudo aqui é bem filmado, bem editado, bem orquestrado. É certo que o facto de ser uma história bem contida ajuda a disfarçar potenciais limitações, mas é de mestre esconder isso com uma hora e meia onde nunca nos desinteressamos do que se passa no ecrã.
O maior defeito de Zalava é quando se torna um pouco meloso e lamechas. Há uma ou duas cenas um pouco desnecessárias que se estendem talvez por mais cinco minutos do que deveriam. Apresenta também algumas atuações de qualidade duvidosa – isto apenas em papéis secundários, terciários na verdade! -, é verdade, mas nada que alguma vez nos retire o foco do que vemos: um thriller muito bem construído onde ninguém sabe muito bem o que está a acontecer. Ninguém naquela vila. Ninguém na sala de cinema. Ninguém futuramente em casa.
Algo que ninguém seguramente irá esquecer são todas as questões que Zalava traz para cima da mesa. Seja ao nível das superstições e medos já mencionados; seja ao nível do eterno confronto entre crenças e ciência; seja ao nível de pensamento e mentalidade de grupo. A forma como o ser humano se comporta quando rodeado por quem pensa como ele é assustadora. Halloween Kills tocou neste tema ainda há pouco tempo, mas Zalava não lhe fica nada atrás nesse aspecto, brilhando ainda mais porque aqui estes homens não lutam contra “o puro mal” de Michael Myers, mas estão sim, do lado contrário aos nossos principais protagonistas. Mas será que estão errados?
O final de Zalava é impactante e irá ficar comigo durante muito tempo. É um filme que terei prazer em revisitar nem que seja apenas para voltar a apreciar a forma como algumas cenas do mesmo são tão bem construídas com a tensão a parecer uma força invisível em todo aquele ambiente, como acontece na espetacular cena final. Mais do que um filme de terror, Zalava é um excelente caso de estudo sobre pessoas, comunidades, pensamento e comportamento de grupo, crenças e medos. Bastante atmosférico, desequilibra-se apenas, por vezes, na busca pelo sentimento fácil.